SINGULARIDADES DE UMA RAPARIGA LOURA
Ontem saiu a lista dos melhores filmes de 2011, segundo os críticos da revista francesa Cahiers du Cinéma. E entre os primeiros lugares está O ESTRANHO CASO DE ANGÉLICA (2010), de Manoel de Oliveira. E eu lembrei, triste, mais uma vez, que os filmes do "Seu Manoel" nunca ou raramente chegam aos cinemas locais. Aconteceu o mesmo com UM FILME FALADO (2003), com ESPELHO MÁGICO (2005) e com BELLE TOUJOURS (2006). Os três, tive de vê-los em casa, mesmo. Assim, não sei como é a experiência de ver um filme de Manoel de Oliveira no cinema. Deve ser uma coisa mágica, especial, que infelizmente fica restrito aos espectadores de algumas capitais e outras cidades próximas dos grandes centros.
E pensando nisso foi que eu resolvi pegar para ver este SINGULARIDADES DE UMA RAPARIGA LOURA (2009), que eu havia baixado já há algum tempo, mas que de alguma maneira deixei guardado com a esperança de que fosse, quem sabe, lançado numa sala de cinema de Fortaleza. Infelizmente não foi e para ser realista não acho que O ESTRANHO CASO DE ANGÉLICA será, embora torça para estar errado. Mas deixemos de reclamações, pois há também motivos para celebrar, pois, em outros tempos, jamais teríamos a chance de ver este tipo de filme em casa.
E depois dos poucos filmes vistos por mim da extensa filmografia do centenário diretor português - que, segundo alguns críticos, é uma figura de tão grande importância para a memória cultural portuguesa quanto o poeta Fernando Pessoa -, estou começando a me familiarizar com o cinema de Oliveira. SINGULARIDADES DE UMA RAPARIGA LOURA é uma delícia. Uma obra genial no andamento, nas escolhas de como deve ser localizada a câmera, no gosto que ele nos proporciona em sua narrativa, adaptada do conto homônimo de Eça de Queirós.
Manoel de Oliveira, em pouco mais de uma hora de duração, sabe muito bem quando deixar o andamento mais lento e quando apressar um pouco mais. Coisa de quem tem a sabedoria de um século ao seu lado e a mente lúcida a seu favor. A imagem de que o filme é feito por um cineasta veterano está presente, mas isso faz parte do charme, como na cena do beijo do casal, quando o diretor prefere mostrar os pés dos amantes – o pé levantado da moça, enquanto beija o rapaz, apaixonado.
Na história, rapaz (Ricardo Trêpa) trabalha na empresa de contabilidade do tio, mas sua vida muda quando da janela percebe uma bela moça loira. Os dois trocam olhares, se encontram, gostam um do outro, mas o maior problema é que o tio não aceita que ele se case com ela. Ele teria que escolher entre ela e o emprego. O pobre rapaz fica louco e abandona o escritório do tio à cata de outro emprego. E é melhor não contar mais, já que o filme é tão curtinho. Completo apenas dizendo que a história é contada num trem, quando o rapaz, angustiado, sente necessidade de desabafar e contar a sua história para uma estranha (Leonor Silveira, rosto familiar dos filmes de Manoel de Oliveira). Fiquei entusiasmado com o filme, tanto que tirou aquela barreira de distanciamento que eu tinha com o cinema do diretor, que eu considerava "difícil" ou muito erudito. Agora eu quero é mais! Sinto que isso é o início de uma grande amizade.
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