Rio - O FILME - 2011
O Rio de Janeiro de Carlos Saldanha continua lindo e compensa a trama cheia de furos e o roteiro extremamente previsível.
A divisão de animações computadorizadas da Fox, a Blue Sky, nunca lançou nenhum clássico per si, jamais chegando a ameaçar realmente o reinado da Pixar. Claro, a trilogia “A Era do Gelo” tem seus momentos (especialmente o primeiro filme), mas os filmes da empresa sempre foram mais voltados para a diversão pura e simples, com temas mais complexos ficando em segundo (ou mesmo em terceiro) plano.
Pois bem, com este “Rio”, a Blue Sky abraça realmente essa filosofia de diversão e entretenimento. Visualmente espetacular e com gags bem divertidas, o foco aqui são as gargalhadas, com a trama ficando realmente para trás, servindo mais como um elo entre as piadas e os personagens do que para contar uma história.
Reconhecendo a fragilidade e previsibilidade do roteiro, o diretor Carlos Saldanha acerta em apostar no carisma de seus personagens e no fabuloso visual do longa, que também serve como um ótimo cartão postal da cidade maravilhosa. Não por acaso, o Rio de Janeiro é a terra natal do cineasta, que transforma a capital fluminense quase em um dos protagonistas do filme, dando a ela um caráter engraçado até mesmo aos seus problemas, retratando-a com amor e saudosismo.
A trama segue as desventuras de Blu, uma arara azul carioca criada nos EUA, mais precisamente no gelado estado de Minnesota, um lugar que não poderia ser mais diferente do seu habitat natural (algo ressaltado por um divertido aviso). Adotado pela gentil e estudiosa Linda, os dois logo desenvolvem uma ligação repleta de carinho. Certo dia, a vida de Blu e de sua dona vira de pernas para o ar com a chegada do atrapalhado ornitólogo Túlio, que revela que o azulado animal é a última arara azul macho do mundo.
Para evitar a extinção de sua espécie, ele deve viajar para o Rio de Janeiro e conquistar a única fêmea de sua raça ainda viva, Jade. No entanto, a tarefa será bem difícil para o domesticado animal, tendo em vista a paixão de Jade por sua liberdade. Para piorar, o estranho casal é capturado por um grupo de contrabandistas. Enquanto Blu e Jade tentam escapar, Linda e Túlio os procuram por toda a cidade, acompanhados por um menino de rua chamado Fernando.
A história não é nada original, parecendo mais uma mistura do péssimo “Dr. Dolitlle 2″ com alguma comédia romântica. No entanto, os personagens se mostram deveras cativantes. É fácil se relacionar com os traumas do neurótico Blu e com a ânsia de liberdade de Jade, bem como com as trapalhadas de Túlio e a meiguice de Linda. Os protagonistas possuem características bem simples e visualmente são bastante expressivos, o que facilita a comunicação com o público.
Além disso, ver brincadeiras com os estereótipos da velha e boa malandragem carioca em figuras positivas e negativas tem resultados hilários. Quando até mesmo os assaltantes de rua se tornam figuras engraçadas, você sabe que o filme acertou na caracterização. Os macacos larápios, o segurança Silvio, o malandro gente-boa Rafael e a dupla de festeiros Nico e Pedro são ótimos coadjuvantes que dão brilho para a animação.
Os vilões também não são muito criativos, mas cumprem seu papel. O destaque aqui é a cacatua Nigel, que trabalha para os contrabandistas. Dublado pelo sempre ótimo Guilherme Briggs, o pássaro feioso é um daqueles antagonistas que amamos odiar! Já o trio de bandidos funciona mais como uma versão abrasileirada dos bandidos molhados de “Esqueceram de Mim”. Por falar na dublagem nacional, ela está ótima, com belos desempenhos dos profissionais, piadas bem adaptadas e as gírias se encaixando muito bem nos diálogos. Destaco o bom desempenho do ator Rodrigo Santoro, que dubla Túlio na versão original e na brasileira.
Meu problema está nos números musicais. A grande maioria das músicas, que não primam por sua inspiração, aliás, são inseridas de modo muito forçado na narrativa (que já não é lá essas coisas).
O melhor personagem em cena, é claro, é a cidade do Rio de Janeiro. Desde a floresta da Tijuca, passando pelo Cristo Redentor, o Pão de Açúcar, a praia de Ipanema e a Sapucaí, Carlos Saldanha traduz seu carinho pela cidade em beleza visual, criando uma versão belíssima desta para a capital, que só ganha tons mais sombrios quando mostra a favela em um plano bastante pesado (mas necessário) da “casa” do garoto Fernando.
O 3D ajuda muito no mergulho nessa versão quase fantasiosa da metrópole, mas não é essencial para aproveitar a viagem. “Rio” é uma bela homenagem de Saldanha à sua terra natal. Embora o roteiro desse tour não seja o dos melhores e as explicações para mostrar os pontos turísticos passem bem longe de serem plausíveis, a vista e as figuras que encontramos por lá acabam fazendo a jornada valer a pena.
___
Thiago Siqueira é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.
Thiago Siqueira é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.
Nenhum comentário:
Postar um comentário