À Toda Prova: thriller investigativo desconstrói regras do gênero
Steven Soderbergh compensa a falta de originalidade da trama com uma estética diferenciada.
Avaliação:
NOTA 7
É
no mínimo frustrante observar como os métodos usados para filmar
determinadas histórias se limitam a seguir regras e fórmulas do gênero e
acabam se padronizando. Neste sentido, torna-se extremamente
satisfatório se deparar com um produto cuja estética confronta o estilo
geralmente imposto, permitindo um novo olhar. É assim que Steven
Soderbergh dirige “À Toda Prova”.
O thriller de espionagem é centrado em Mallory Kane (Gina Carano),
uma agente de uma companhia de investigações privada que descobre a
traição de um dos seus colegas de trabalho. Sem saber em quem confiar,
Mallory age por conta própria para sobreviver e punir o traidor. A
premissa não poderia ser mais clichê, mas o longa traz algumas boas
surpresas.
Em seu roteiro, Lem Dobbs sabe ser explicativo quando necessário. Os
diálogos são pacientes e em momento algum escapam da relação entre os
personagens para dar satisfações ao público. Isso nos prepara e nos
interessa para adentrarmos aos poucos um terreno cheio de intrigas. Não
há uma preocupação em contar a história de nenhum personagem, focando
apenas o momento que o filme aborda, o que ajuda a prender mais a
atenção e comprar a ideia mesmo já desgastada.
Carano, ex-lutadora de MMA e atriz novata em cinema, mostra que tem
talento nos dois casos. Sua atuação pouco expressiva, mas natural,
evidencia a segurança e o profissionalismo da personagem. Sua
feminilidade não desaparece em meio ao caráter “masculinizado” de
Mallroy, mas também nunca é sexualizada. As cenas de luta se aproveitam
bastante da experiência da atriz como esportista, sendo um dos pontos
altos da produção. A coreografia é bem elaborada sem soar artificial.
É perceptível a atenção que Soderbergh dá a estas cenas, e é nelas
onde mais vemos a proposta diferenciada do diretor. A câmera se mantém
parada ou com poucos movimentos, dando preferência a planos mais abertos
que permitem uma melhor noção de espaço e da luta em si. Isso vai
contra a moda da câmera tremida, presente na grande maioria dos filmes
de ação. Dessa forma, todo o ritmo da luta se apóia na interessante
montagem de Mary Ann Bernard (pseudônimo do próprio Soderbergh).
A edição de som é precisa no tocante à utilização da trilha de David
Holmes como parte da construção narrativa. A ausência de músicas nas
sequências de luta contribui ainda mais para o realismo destas, tornando
cru o que costuma ser “espetacularizado” no cinema americano. No
entanto, quando presentes, elas resgatam majestosamente a atmosfera dos
filmes de espionagem da década de 70, funcionando como um ótimo pano de
fundo para sequências mais didáticas ou de transição.
O elenco coadjuvante é formidável. Ewan McGregor, Michael Douglas e
Antonio Banderas interpretam, respectivamente, Kenneth, Coblenz e
Rodrigo, todos superiores de Mallory. Michael Fassbender vive Paul, um
agente freelancer contratado para uma missão ao lado da
protagonista. Channing Tatum é Aaron, que conheceu Mallory recentemente
em uma missão na Barcelona. A escolha destes atores veteranos foi uma
ótima estratégia para manter fortes personagens que são pouco
trabalhados.
“À Toda Prova” é um filme que faz muito do pouco. Potencializa uma
história já contada inúmeras vezes, demonstrando como a abordagem acerca
de um tema vale muito mais do que o próprio conteúdo deste. A
desconstrução de regras de gênero é um exercício que exige uma reflexão
madura sobre o que está sendo mostrado e como isso afeta os envolvidos
neste trabalho pessoalmente. Além de abrir novas possibilidades nas
formas de comunicação com o público, mantém-se um bom entretenimento.
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Thiago César é formado em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mas aspirante a cineasta. Já fez cursos na área de audiovisual e realiza filmes independentes.
Thiago César é formado em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mas aspirante a cineasta. Já fez cursos na área de audiovisual e realiza filmes independentes.
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