Avaliação: NOTA 7
 


Em seus anos áureos, a Hammer realizou grandes obras de terror, sempre lançando mão de talentos como Christopher Lee e Peter Cushing, moldando todo o gênero. Portanto, é mais do que natural que este “A Mulher de Preto” tente resgatar um pouco do senso clássico desta vertente cinematográfica tão adorada.

E, até certo ponto, trata-se de uma verdadeira fita de horror à moda antiga, contando mais com sua ambientação e com o clima para envolver o público em uma atmosfera tensa, sem jamais apelar para o choque barato para causar alguma reação em sua audiência.

Baseado no livro homônimo de Susan Hill e adaptado por Jane Goldman, o filme se passa na Inglaterra do século XIX, se utiliza levemente de alguns elementos espíritas e apresenta o jovem advogado Arthur Kibbs (Daniel Radcliffe), cuja vida está sem rumo após a perda de sua esposa.

Tentando salvar sua carreira e o futuro de seu filho, Arthur recebe a missão de cuidar do espólio de uma velha cliente de seu escritório, cujos bens incluem uma mansão isolada em um lugarejo inglês.

No entanto, Arthur encontra uma inesperada resistência local à venda do imóvel e, com a ajuda de seu amigo Samuel Daily (Ciarán Hinds), tenta desvendar o terrível segredo que cerca aquela cidade.

Sem sombra de dúvidas, o maior chamariz para o público jovem é a presença no elenco de Daniel Radcliffe, astro da franquia “Harry Potter”. Aqui, Radcliffe lida com sentimentos que lhe cercaram na já encerrada saga, como perda, morte e luto. Obviamente, o lado psicológico de seu personagem ganha mais destaque, com o ator jamais decepcionando. Sentimos a todo instante o peso que Arthur carrega em suas costas e a dúvida (e esperança) que carrega em relação à possibilidade de vida após a morte.

Radcliffe surge com uma expressão constantemente carregada e somente encontra algum alento quando está na presença de seu filho, o que acontece durante pouco tempo durante a projeção. O ator parece ser um tanto jovem hoje em dia para ter um filho de quatro anos, mas tal fato, para a época na qual a história se passa, era absolutamente normal.

O protagonista também possui uma ótima química com o competente Ciarán Hinds, seu racional amigo e único aliado em sua tarefa em descobrir qual o mistério daquela mansão cercada por pântanos. É interessante notar como a relação quase paternal entre os dois evolui, sendo este um dos elementos mais curiosos em cena.

O imóvel é um personagem à parte na película, graças a uma bem cuidada direção de arte e de uma fotografia que investe em tons escuros, mas que jamais torna impossível a exploração dos quadros pelo espectador. Destarte, o casarão ganha uma personalidade sinistra bastante peculiar. A sensação de isolamento que Arthur sente toda vez que se aventura por lá é ressaltada por ótimos travellings que ilustram muito bem como o lugar é praticamente uma ilha.
 
Em seu segundo trabalho como realizador, a grata surpresa vem do diretor James Watkins. A despeito de eventualmente ceder à tentação de acentuar uma cena mais assustadora com a trilha sonora, o cineasta percebeu que a fita requer um trabalho mais atmosférico. Notem como a névoa que vemos em dados pontos da projeção dão um bastante apropriado ar etéreo às figuras que surgem na tela.

Além disso, o diretor demonstra inteligência e alguma sutileza ao não colocar como destaques óbvios certos elementos-chave de determinados quadros, sabendo conduzir bem a audiência ao estado de tensão sem esfregar o perigo em seus rostos. Afinal, o maior medo que uma pessoa pode ter é daquilo que não sabemos exatamente se está lá ou não.

Mesmo com um desfecho um tanto quanto abrupto, mas na melhor tradição da Hammer, “A Dama de Preto” é um filme de terror que honra o seu DNA, contando com atuações competentes e uma estética perfeita para o que se propõe.
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Thiago Siqueira é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.