A história de amor escondida em choques linguísticos é o tema de "Budapeste" – que tem potencial para se tornar a melhor produção brasileira do ano –, baseado na obra literária do venerado cantor e compositor Chico Buarque.
No longa, José Costa (Leonardo Medeiros) é um brilhante ghost-writer (escritor fantasma) que vive à sombra de sua profissão e frustrado com a vida. Em uma viagem acidental a Budapeste, Costa descobre uma nova língua e um novo rumo.
A adaptação de um livro tão subjetivo quanto esse gerou receio por parte do escritor e da roteirista, Rita Buzzar. No entanto, "Budapeste" acaba saindo-se muito bem e encontra seu ponto forte na direção do renomado diretor de fotografia Walter Carvalho. A fotografia, aliás, diz muito sobre a narrativa da história. Nos créditos iniciais, em voice over ouvimos Costa dizer que sempre achou que Budapeste era uma cidade cinzenta, mas não: ela é amarela. Com isso, os planos da capital da Hungria tornam-se muito mais atraentes e com cores mais quentes e chamativas do que a badalada cidade do Rio de Janeiro, que aqui adquire, na maioria das vezes, uma tonalidade azulada e triste, como se o espectador enxergasse os dois locais pelos olhos do protagonista. Dessa forma, vamos descobrindo os encantos de Budapeste ao mesmo tempo em que Costa apaixona-se pela cidade e pelo idioma. Ao retornar ao Brasil e reencontrar sua mulher, Vanda (Giovanna Antonelli), as coisas parecem se tornar automaticamente monótonas. Em um cubículo com cara de escritório de administração, José Costa escreve as mais belas palavras para as biografias das pessoas que o procuram para contar uma história. Assim, Costa escreve "O Ginógrafo" – romance sobre as impressões de um alemão em terras brasileiras. Vanda acha o livro um sucesso, sem saber que na verdade seu marido é o autor por trás de tudo aquilo. Esse é o estopim para a virada principal do filme, quando José Costa embarca em direção à Hungria e torna-se Kósta Zsoze, com a ajuda de sua nova paixão, a húngara Kriska (Gabriella Hámori). Em uma das mais expressivas cenas do longa, Kriska e Costa – ele sem entender o húngaro, ela sem entender o português – correm pela rua em um diálogo improvisado, a la Jules e Jim.
Essa cena, por sinal, não é a única que experimenta um frescor ímpar: muitas das sequências entre Leonardo e Gabriella (que se conheceram ao mesmo tempo em que seus personagens, graças a uma exigência de Walter Carvalho) são seguidas principalmente pela intuição dos atores em cena, onde Kriska tenta ensinar aos poucos sua língua para Costa. Em sua nova vida e rotina, Costa conquista aos poucos seu espaço e cria lentamente novos laços com uma língua dificílima. Não à toa, o espectador não se sente constrangido pelo personagem quando este arranja um emprego que claramente não está a sua altura – não importa, pois sua realização é tão maior, que não demora até a recompensa surgir. Indo do céu ao inferno várias vezes, assistimos a desconstrução e reconstrução de Costa diante das dificuldades que ele enfrenta, o que acaba conferindo ao longa um tom onírico e de incertezas sobre o destino dos personagens e se eles de fato existem assim como se apresentam diante de nós.
Por: Marina Alves
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