- Em “Um Ato de Liberdade”, o diretor Edward Zwick retoma o tema do holocausto nos cinemas com a desconhecida história dos irmãos Bielski, três jovens que comandaram a resistência judaica aos nazistas no interior da Bielorrússia. Apesar de ficar longe de criar um dos melhores filmes sobre o assunto, Zwick realiza uma obra.
- O massacre sofrido pelos judeus comandado pelo regime nazista de Hitler já foi retratado de inúmeras formas nas telonas, seja física ou psicologicamente. Certamente, o principal filme sobre a temática é a obra-prima de Steven Spielberg, “A Lista de Schindler” (1993), que possui como foco central os horrores nos campos de concentração nazistas. Ganhador de sete Oscars, a película faz uma reconstituição tão impressionante da época que é difícil compará-la com outras produções. Mais recentemente, dois outros filmes abordaram o contexto de formas distintas. Enquanto em “O Pianista” (2002), Roman Polanski contou a saga de um artista polonês durante a sua fuga das tropas alemãs, Stephen Daldry, em “O Leitor” (2009), falou sobre a culpa que uma ex-guarda nazista carregou até o final de sua vida. Todos os três filmes citados apostam na emoção como o seu combustível fundamental. E é exatamente essa característica que separa “Um Ato de Liberdade” dos grandes títulos sobre o assunto, mesmo possuindo uma trama original.
- Movidos pelo medo e pela vontade de vingança que a morte de seus pais pelos guardas alemães lhes causa, os três irmãos Bielski, Tuvia (Daniel Craig), Zus (Liev Schreiber) e Asael (Jamie Bell), decidem se refugiar nas florestas inexploradas do território bielo-russo. O ano é 1941 e as vilas não são mais locais seguros. Matanças desmedidas acontecem diariamente e levam pânico para o restante da população ainda com vida. A ideia de montar uma resistência acontece naturalmente: Tuvia acaba adquirindo uma arma para vingar a morte de seus pais e, com a perfeita execução do plano, a única saída é a autoproteção. Porém, exacerbações de ódio ocorrem e o grupo opta erroneamente por executar delatores, além dos próprios guardas nazistas que vigiam a área. A ação acaba chamando a atenção de amigos e inimigos e dissemina o nome dos “Bielski” pela região.
- Aos poucos, o acampamento modesto dos guerrilheiros vai abrigando mais e mais sobreviventes, o que acaba, para desagrado de Zus, mudando o objetivo do destacamento. Eles não mais passam a atacar, mas apenas a proteger o que já consideram ser uma comunidade. Outras diferenças ideológicas tornam a situação de Zus insustentável no local, e ele escolhe por deixar a companhia dos irmãos e se aliar às tropas russas, localizadas a poucos quilômetros do acampamento. Com a “deserção” do irmão, Tuvia assume o comando do “Otriad Bielski”, mas se engana quem pensa que a situação agora é bem mais favorável a seu favor. Além das ameaças externas, Tuvia tem de enfrentar os desafios que a liderança de uma comunidade demanda, como a distribuição igualitária da comida. No entanto, o rapaz, com toda a sua competência e força de vontade, e contando com a ajuda dos companheiros de luta, consegue escrever uma bela história de sobrevivência em meio à matança que os judeus sofreram durante a Segunda Guerra Mundial.
- O assunto guerra, aliás, deve despertar o imediato interesse do diretor norte-americano Edward Zwick. Conhecido por produções que se passam em meio a confrontos sociais ou políticos, o cineasta adora tratar de temas sérios e trágicos através de histórias comuns e, às vezes, forçadamente emocionais. Em "Diamante de Sangue" (2006), por exemplo, Zwick retrata uma guerra civil africana com toques hollywoodianos, seja pela sua idealização exagerada ou pela inserção de rasos personagens estrangeiros. No entanto, a grande falha de suas películas sempre foi a falta de ritmo, ou seja, os bocejos de sono não são raros quando assistimos a um de seus filmes. A característica fica muito evidente no chato “O Último Samurai” (2003). Já em “Um Ato de Liberdade”, ele conserta esse erro e cria uma narrativa mais atraente e veloz.
- Passada quase inteiramente nos confins da floresta, a trama começa lentamente, mas acelera principalmente perto do seu desfecho. A razão para essa boa mudança é o ótimo ritmo que as cenas de ação apresentam, cujo mérito se deve ao diretor e sua parceria com o editor Steven Rosenblum. Os cortes rápidos e as câmeras lentas são técnicas usadas cadenciada e inteligentemente pela dupla. Apesar dos inúmeros acertos, um erro crucial quase acaba estragando todo o filme. A transformação de Zus em um herói por meio de uma tomada longa de um ângulo inferior é lamentável. Entretanto, em geral, o resultado é positivo.
- O mesmo não se pode dizer do roteiro, que é assinado pelo próprio Zwick e por Clayton Frohman. O maior erro do argumento é exatamente não sensibilizar as personagens. Mesmo depois de terem parentes assassinados pelos nazistas, os irmãos judeus não demonstram quase nenhum remorso, tanto que são capazes de, pouco tempo depois, terem uma caso amoroso com outras mulheres. A falta de emoção, mesmo com a trilha melosa de James Newton Howard, prejudica a verossimilhança de uma história que é baseada em fatos reais, de acordo com o livro do sociólogo polonês Nechama Tec, “Um Ato de Liberdade – Os Guerrilheiros de Bielski”. Os diálogos comuns e a transformação de Tuvia em um mártir acabam soando piegas e dão ao filme um ar de “dejá-vu”.
- Contando com um elenco competente, “Um Ato de Liberdade” beneficia-se também da evidência que seus atores principais possuem na mídia atualmente. Daniel Craig mostra porque não vai ficar marcado somente com o agente James Bond até o fim da carreira e domina o filme. Mesmo o roteiro tentando desesperadamente idealizar o seu personagem, Craig o humaniza delicadamente. As cenas finais em que demonstra fraqueza e medo são as suas melhores. Liev Schreiber fica prejudicado pelo pouco tempo de tela, mas aproveita bem as oportunidades para transformar Zus em uma espécie de herói trágico. Já Jamie Bell rouba muitas cenas como o forte adolescente Asael. O romance inocente que vive com Chaya (Mia Wasikowska) é muito bem desenvolvido pelo roteiro e a química entre os atores funciona.
- Com uma trama original, mas que é tratada com uma linguagem cinematográfica comum, “Um Ato de Liberdade” consegue ser um bom drama de guerra. A incrível história dos irmãos Bielski, que chegaram a salvar mais de 1200 judeus, poderia ter atingido um nível bem maior se não fosse a limitação técnica de seu roteiro. Mas ainda assim, vale a pena conferir mais uma incrível narrativa sobre como os judeus conseguiram escapar da fúria do exército nazista.
Por: Darlano Didimo
NOTA...7
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