Avaliação: NOTA 5
 


Tô me sentindo parte de uma opereta épica e mal-escrita“, diz o Major Esdras, personagem de Otávio Müller em dado ponto de “Reis e Ratos”. Isso se aplica a todos os personagens do filme. Mauro Lima, roteirista e diretor da fita, tencionou fazer uma caricatura da Guerra Fria, no melhor estilo “Dr. Fantástico”, mas se perde em meio a um verdadeiro mar de personagens e uma trama que não chega a lugar nenhum.

Às vésperas do Golpe Militar de 1964, uma série de conspirações eclode por conta da explosão de um coreto no interior do Rio de Janeiro. No centro de tudo, está o agente da CIA Troy Summerset (Selton Mello), apaixonado pelo Brasil e que quer mais é curtir a vida mansa da terrinha, sempre contando com a ajuda do fiel Major Esdras. A meta dos dois é manter o comunismo longe das praias tupiniquins, se envolvendo com figuras pitorescas como a bela corista Amélia (Rafaela Mandelli), o trambiqueiro Roni Rato (Rodrigo Santoro), o locutor de rádio paranormal Hervê (Cauã Reymond), dentre outros.

O diretor Mauro Lima acerta o tom canastrão e esfumaçado da farsa junto aos atores, completo com dicções dignas de locutores de rádio cinquentistas. Selton Mello está divertidíssimo como o americano mais carioca de todos os tempos, tendo uma boa química com Otávio Müller. Rafaela Mandelli, com um carregado sotaque sulista, acaba sendo uma boa femme fatale (em todos os sentidos).

O astro Rodrigo Santoro, outro destaque, conta com a ajuda de uma excelente maquiagem para se transformar no desprezível Roni Rato. Seu Jorge dá apenas um “oi”, aparecendo pouquíssimo na tela, embora gere boas piadas. Já Cauã Reymond, embora surja com uma interessante caracterização com seu Hervê, acaba prejudicado pela própria trama do filme.

Sim, pois o problema de “Reis e Ratos” não está em seu elenco ou no seu universo povoado por personagens pitorescos, mas em seu roteiro. À medida que a trama avança, esta se revela cada vez mais frágil e sem rumo, sem fazer jus àquelas figuras bizarras pelas quais acabamos por nos afeiçoar. Os planos dos agentes americanos soam tolos e até mesmo o agente soviético escondido, ponto crucial da plot, não faz nenhum sentido. Ao final da projeção, não percebemos que alguma coisa foi alcançada ou mesmo que uma história foi exposta de maneira satisfatória.

Embora a produção consiga lidar muito bem com as idas e vindas do roteiro se utilizando de uma fotografia em preto e branco para o longo flashback que expõe as conspirações de Troy, Lima lança mão de uma narração feita por Amélia, que soa expositiva e intrusiva demais, sem explicar nem mesmo como a corista soube de alguns detalhes daquilo que está narrando, o que resulta em um tremendo furo.

Contando com uma boa fotografia que serve à narrativa, uma direção de arte fabulosa e que consegue recriar bem o período golpista e personagens interessantes adequadamente cartunescos vividos por atores competentes, “Reis e Ratos” é sabotado por sua história que atira para todos os lados e acerta poucos alvos. Até mesmo a música-título de Caetano Veloso só vem à tona praticamente nos créditos finais.

Mesmo com algumas risadas esporádicas, como na cena da sauna e na bancada de Troy, o filme jamais faz jus ao seu universo. Uma pena.
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Thiago Siqueira é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.