Avaliação: NOTA  5
 
 


“O Lorax – Em Busca da Trúfula Perdida” é deveras contraditório. Esta adaptação do livro infantil escrito pelo celebrado Dr. Seuss nos anos 1970 é uma fábula contra os perigos de se deixar levar pela ganância e explorar os recursos do nosso mundo até que se esvaiam, com o artificial sobrepujando o natural. 

O problema é que o filme, dirigido por Chris Renaud (“Meu Malvado Favorito”), se entrega a essa mesma artificialidade em favor de necessidades comerciais, deixando de lado tudo o que tornou a obra única para se concentrar em clichês batidos e facilmente digeríveis.

Parte do plot segue o original literário, com o ermitão Umavezildo contando para um garoto como, a despeito dos avisos de uma criatura baixinha, emburrada e bigoduda chamada de Lorax, ele e sua ambição em fazer algo que todos iriam comprar destruíram uma floresta linda e cheia de vida. No entanto, o roteirista Ken Daurio resolveu aprofundar a história do garoto, aqui chamado de Ted, em uma segunda trama, que parece ter sido feita apenas para suprir demandas mercadológicas.

Ted vive em uma cidade onde tudo é artificial e o ar é tão poluído que oxigênio é engarrafado e vendido pelo ganancioso O’Hare, que é praticamente o dono da cidade. Quando o guri descobre a fascinação de sua amada Audrey pelas antigas árvores que costumavam crescer do chão, ele resolve encontrar uma para ganhar o coração da menina. Indo além dos limites da cidade, ele encontra Umavezildo, que começa a contar do seu triste passado.

O problema é que, ao expandir a participação de Ted, o roteiro acaba se desestruturando e dando mais espaço ao garoto do que a Umavezildo e Lorax, cuja participação acaba bastante reduzida, deixando de ser o protagonista de sua própria trama. O pequeno deveria simbolizar o público aprendendo com os erros do ermitão e recebendo sabedoria e esperança para um futuro melhor. Ao invés disso, é transformado em um mero veículo para que os realizadores enfiassem ali um interesse amoroso e um vilão unidimensional.

A presença do patético vilão O’Hare acaba esvaziando a importância de Umavezildo e de sua jornada até se tornar aquele responsável pela devastação da floresta. Mas nem todas as mudanças foram para pior. Mostrar o rosto de Umavezildo durante a juventude em sua “viagem empreendedora” e fazer com que presenciássemos todo o esforço do rapaz em conseguir subir na vida foi uma decisão lógica para criar alguma empatia do público para com o personagem e justificar o carinho que o Lorax sente por ele, algo que seria difícil se a versão de Dr. Seuss fosse seguida e onde o relacionamento entre os dois é mais adversarial.

Mais lógico ainda seria se o longa prosseguisse com essa linha de pensamento e, ao invés de resumir a ascensão e queda do rapaz em apenas uma música, o explorasse devidamente. Nisso, somos brindados com minutos e mais minutos do extremamente caricato Sr. O’Hare, que parece o primo mais idiota e baixinho do Presidente Skroob de “S.O.S. – Tem Um Louco Solto no Espaço”, deixando em último plano o que deveria ser o ponto principal da história, que seria como a ganância mudou Umavezildo e matou a floresta, a despeito dos avisos do Lorax.

As criaturas vindas diretamente do livro mantiveram suas identidades visuais intactas, com destaque para o próprio Lorax e para os peixes cantantes, sempre divertidos em suas participações – incluindo uma versão própria para o tema principal da franquia “Missão: Impossível”. Até mesmo a versão idosa de Umavezildo manteve as luvas verdes quando surge das sombras de seu lar em ruínas. Por outro lado, toda a cidade de Ted parece tão genérica que pouca coisa acaba sendo memorável, como a árvore com iluminação disco.

Incluindo algumas cenas de ação dispensáveis para justificar um 3D bastante intrusivo e números musicais pouco imaginativos, “O Lorax – Em Busca da Trúfula Perdida” jamais chega aos pés do seu material original, resultando em uma animação deveras esquecível, sem identidade ou carisma. Enquanto os cenas que envolvem Umavezildo e Lorax funcionam relativamente bem, elas empalidecem perante o monstro da falta de imaginação que domina o restante desta produção.
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Thiago Siqueira é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.