Data: 06 de Agosto de 2009
Por: Thiago Siqueira
Bela Noite Para Voar é uma livre adaptação para os cinemas do livro homônimo, escrito por Pedro Rogério Moreira, que narra uma tentativa de assassinato verídica contra o então presidente Juscelino Kubitschek. Embora tente dar ao Brasil o seu próprio presidente-herói, o filme acaba falhando em tentar imprimir tensão em sua narrativa, ficando apenas na boa intenção e como curiosidade histórica mesmo.
Juscelino Kubitschek foi um caso atípico no Brasil. Visionário e um tanto megalomaníaco, sua meta de transformar o Brasil de um mero país agrícola em uma potência industrial, por mais nobre e válida que fosse, acabou endividando e muito a nação.
No entanto, é uma figura interessante do ponto histórico e sua interessante vida renderia vários bons filmes. Foi sabendo disto que embarquei neste " Bela Noite Para Voar", mas o resultado não faz jus ao "Presidente Bossa-Nova". A história enfoca um incidente bastante complicado da vida do político quando oficiais da aeronáutica colocaram em prática uma conspiração para matá-lo.
Enquanto o Presidente (vivido por José de Abreu) queria apenas realizar sua agenda e ver sua amada amante, uma mulher casada a quem ele chama carinhosamente de Princesa (Mariana Ximenes), mal sabe ele que corre um risco grave de morte, enquanto homens leais a ele tentam salvar-lhe a vida. Paralelamente, acompanhamos várias intrigas políticas se desenrolando, principalmente uma envolvendo o líder da oposição ao governo, Carlos Lacerda (Marcos Palmeira), sendo tentado pelos conspiradores a fazer parte da tentativa de golpe.
Embora seja muito bom ver figuras tão complexas do passado recente de nosso país saltarem para as telas, vários destes personagens aparecem extremamente caricatural. Aliás, o próprio filme possui um tom maniqueísta completamente despropositado em dados momentos, em uma clara falha do diretor/roteirista Zelito Viana.
As reuniões dos militares da aeronáutica mais parecem um encontro dos vilões do ridículo seriado sessentista "Batman", com os vilões maquinando como irão derrubar o herói, contando até mesmo frases do tipo "desta vez ele não escapa!" e "da próxima pegamos ele!". O longa não consegue nem mesmo apresentar os personagens de maneira orgânica, apelando sempre para que um terceiro diga o nome completo do personagem a ser introduzido de maneiras absolutamente forçadas.
Até mesmo Juscelino Kubitschek é retratado quase como um homem simples, alguém que passa através dos eventos e não os causa, algo que atrapalha e muito a performace de José de Abreu, que se sai melhor nos diálogos entre JK e o estranho Jânio Quadros (Cássio Scapin), bem como nos discursos do Presidente. O fato do presidente não saber do perigo que passa até o último ato da projeção contribui bastante para isso, já que o personagem permanece soltando frases de efeito e suspirando por sua princesa durante boa parte da projeção. E colocar o conhecido (e nem tão talentoso) comediante David Pinheiro como comandante do avião não ajuda mesmo.
Nem mesmo o romance do casal principal é bem explorado. O longa falha em estabelecer o casal formado pelo Presidente e sua Princesa como um casal amoroso, mais parecendo que os dois estão cometendo adultério por mero desejo lascivo, não havendo fagulhas nem química entre José de Abreu e Mariana Ximenes, quem o filme tenta desesperadamente mostrar como uma doce mulher fatal, em uma contradição que acaba por matar a personagem, embora a câmera de Viana a mostre de ângulos que certamente irão captar a atenção da platéia masculina.
O único personagem que realmente é bem desenvolvido é o de Carlos Lacerda, que é retratado como um homem idealista que realmente discorda do governo, mas que é fiel aos ideais democráticos, além de ser um homem de família, dividido entre a dívida que tem para com os homens da aeronáutica e seus próprios ideais.
Fazendo par com Julia Lemmertz, que vive sua esposa, por vezes os dois parecem ser os protagonistas da trama, já que possuem um plot melhor desenvolvido e situações bem mais interessantes mostradas em cena. Tecnicamente, o filme não se sai melhor.
Tanto nos enquadramentos de Viana quanto na fotografia de Alziro Barbosa, a impressão que se tem é de que estamos assistindo a um especial de fim-de-ano da Rede Globo, com até mesmo a série "JK" produzida pela emissora sendo mais interessante do ponto de vista gráfico. A edição é ridícula, inserindo fotos em preto e branco sob um fundo musical de "tensão" em quase todas as mudanças de cenário, mesmo quando a cena a seguir não tem nada tensão alguma.
No entanto, o filme possui efeitos especiais decentes (para uma produção brasileira, claro) e a direção de arte feita por Alexandre Meyer acaba se destacando, conseguindo recriar muito bem os ambientes do Brasil no começo dos anos 1960. Excetuando-se apenas a boa atuação de Marcos Palmeira e as curvas de Mariana Ximenes, o que temos em "Bela Noite Para Voar" é um filme fraco, que nem toda a curiosidade histórica do mundo conseguiria salvar. Chega até a ser irônico que, em um filme sobre JK, o melhor personagem seja Carlos Lacerda.
Cotação: ****(4/10)
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