quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Coppola, 70, faz as pazes com o jovem Coppola

























































































































Por Sérgio Rizzo (em Nova York)

O penúltimo longa-metragem de Francis Coppola, “Youth Without Youth” (2007),
não foi lançado comercialmente no Brasil. O mais recente, “Tetro” (2009), não aparece no calendário de lançamentos do Filme B. Se dois longas consecutivos de Coppola permanecerem inéditos no Brasil, teremos uma situação que seria inimaginável nos anos 70, quando o diretor de “O Poderoso Chefão” (1972) e “Apocalypse Now” (1979) era um dos cineastas de maior prestígio em Hollywood, ou mesmo nos anos 80 e 90, quando todos os seus longas foram exibidos no Brasil, de “O Fundo do Coração” (1982), que finalmente está sendo lançado em DVD no Brasil, até “O Homem que Fazia Chover” (1997).

Consolo número 1: é difícil ver “Tetro” inclusive nos EUA. Em Nova York, cujo circuito para filmes adultos ainda mantém seu vigor, ele está em cartaz em apenas uma sala, no simpático Landmark’s Sunshine, em East Village. Estreou em 11 de junho e arrecadou até agora menos de US$ 200 mil (para um orçamento estimado em US$ 15 milhões). Quando assisti ao filme, na semana passada, a sessão tinha cerca de 50 espectadores, quase todos na faixa etária de quem conheceu Coppola, hoje com 70 anos, quando “Chefão” foi lançado.

Consolo número 2: o próprio cineasta garante preferir esse modo de fazer cinema, independente e de alcance mais restrito, do que a lógica das superproduções. É o que diz em entrevista a Danny Munso, publicada na edição de maio/junho da revista “Creative Screenwriting”. “Para mim, quanto menor o orçamento, mais você pode trabalhar suas ideias”, afirma. “Quanto maior o orçamento, mais você precisa satisfazer o potencial de 4 mil cópias que correrão o país. Esses últimos são roteiros muito menos pessoais; eles tendem a ser roteiros de gênero.”

Coppola escreveu peças de teatro na adolescência e acreditava que seus roteiros para cinema seriam uma extensão dessa atividade, “pequenos e íntimos”. Acabou se afastando desse território criativo mais pessoal por cerca de 35 anos; “Tetro” é seu primeiro roteiro original (ou seja, baseado em argumento de sua autoria) desde o hoje clássico “A Conversação” (1974). Coppola admite, no entanto, que a responsabilidade por esse desvio é sua. “Eu saí dos trilhos depois do que aconteceu com ‘Chefão’. O tipo de sucesso que obtive pareceu me distanciar da espécie de cineasta que eu queria ser.”

Em “Tetro”, Coppola diz ter se mantido fiel a seu método de roteirização: não voltar ao que escreveu, para reler ou editar o material, antes de terminar a primeira versão do roteiro. Inicialmente, reuniu duas páginas de notas; eram fragmentos de uma história sobre um jovem que procurava seu irmão mais velho. Depois de escrever as primeiras 15 páginas, fez uma parada para imaginar em que direção a trama prosseguiria. Mais tarde, na página 60, outra parada, desta vez para imaginar como encontraria um desfecho. E daí seguiu até o final, deixando para reler o que fez apenas depois de concluir o trabalho.

Outro de seus conselhos para roteiristas talvez pareça inusitado: casar e construir uma família. “Eu era muito jovem quando me casei, e não tinha carreira nenhuma”, explica. “Descobri que a responsabilidade de ser marido e pai tende a lhe dar um foco e a fazer com que você se sente para trabalhar de forma regular.” Como já ocorreu em outros de seus filmes, os valores familiares estão no centro do argumento de “Tetro”, que lembra um pouco, em outras circunstâncias, a relação entre os irmãos de “O Selvagem da Motocicleta” (1983).

Um marinheiro (Alden Ehrenreich) aproveita a parada de seu navio em Buenos Aires para visitar o irmão mais velho (Vincent Gallo), que era seu ídolo e que não vê há anos. Ali, conhece a cunhada (Maribel Verdu) e descobre, por meio do diário secreto do irmão, fantasmas do passado que levam ao pai deles, um famoso maestro e compositor (Klaus Maria Brandauer). A boemia da capital argentina é recriada de forma romântica, em preto-e-branco; flash-backs e pesadelos são coloridos. “Tetro” é “pequeno” e despretensioso, mas com uma enorme dose de afeto, temperado por elementos da cultura italiana e característico de quem, aos 70, parece ter feito as pazes com o jovem cineasta que um dia foi.

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