terça-feira, 15 de maio de 2012

best man curtain call e1336740947225 Primavera em Nova York 2012   Primeira parte

Chuva leve e uma temperatura agradável. Mas sem sol o Times Square fica frio e sem graça. Costumo vir todos os anos para Nova York nesta época porque é o momento estratégico em que estão em cartaz todas as melhores peças da temporada que desejam concorrer ao Tony, ou seja, o Oscar do teatro.

É também o momento em que fecha aquilo que não deu certo e desde que estou aqui duas já anunciaram seu fechamento, uma comédia chamada Seminar, que estava com Jeff Goldblum e um musical caro chamado Leap of Faith (versão de um filme chamado Fé Demais) e Cheira Mal, que era com Steve Martin, o show e com Raul Esparza.

A crítica acabou com ele chamando-o de buraco negro e vai fechar neste fim de semana. Eu já tinha decidido não vê-lo já que tem outras opções boas em cartaz. Ah, também saiu a notícia pela TV que vai fechar o musical Como Vencer na Vida sem Fazer Força.

Mas isso já era previsível desde que largou o show o Daniel Radcliffe (Harry Potter, com quem eu vi e gostei muito). Quem está em cartaz, ao menos nesses dias ainda, é Nick Jonas, um dos Jonas Brothers da Disney (talvez o mais inexpressivo, não tem cara de nada, nem suas fãs conseguiram segurar a bilheteria).

Diante da necessidade de escolher, eu vou deixar de ver uma nova montagem de Um Bonde Chamado Desejo só com atores negros, a comédia Harvey (só estreia no dia seguinte ao que vou embora), a comédia All Black, premiada com o Pulitzer, Clybourne Park, Evita (já vi demais), o erótico Venus in Fur, Magic/Bird sobre basquetebol (outra que está fechando), remontagens de Godspell e Jesus Christ Superstar (ambas elogiadas, mas já vi muitas versões e não dá par ficar mais tempo). Enfim, a vida é sempre uma escolha e não se pode ter tudo... Palavras que consolam.
Comecei no dia em que cheguei - porque achei que era um início com chave de ouro- assistindo Gore Vidal’s The Best Man, que ele escreveu no começo dos anos 60 e que contém referências a infidelidade do presidente Kennedy!

Há uns poucos anos teve outra remontagem que perdi, mas lembro bem do filme, que foi chamado aqui ridiculamente de Vassalos da Ambição. Dirigido por Franklin Schaffner, tinha Cliff Robertson, Henry Fonda e me lembro que era em preto e branco e tinha certo impacto porque foi dos primeiros filmes a tocar no assunto de homossexualismo (o jovem candidato a indicação para concorrer à presidência de um partido, é suspeito de ter tido no passado ligações homossexuais quando serviu o exército).

Esta montagem é notável pelo elenco que reuniu, começando por Angela Lansbury (na verdade é uma participação especial com apenas duas cenas longas e não havia mesmo porque ser indicada ao Tony), que faz uma matrona fofoqueira moralista com seu tom habitual um pouco over the top.
Mas acho sempre um privilégio ver esta lenda viva em cena, uma das poucas sobreviventes e em ação (é a terceira vez que a vejo com sua bengalinha depois de A Little Night Music e Blithe Spirit).

Quem rouba literalmente a montagem e foi indicado ao Tony é outra figura lendária, o James Earl Jones, que é a voz da CNN e o Darth Vader, que eu já tinha encontrado, mas nunca tinha visto em cena. Embora veterano ele dá um show

Vibrante e versátil encontrando novos tons na figura de um antigo presidente americano que está morrendo de câncer e na dúvida de quem apoiar. Chegou mesmo em ser aplaudido em cena aberta com todo respeito.

Além disso, é um prazer se ouvir um texto inteligente de Gore Vidal, cheio de frases notáveis dignos de um Oscar Wilde. Claro que é coisa de teatro (hoje saiu uma reportagem no New York Times justamente comentando isso)!

Por acaso no dia era também aniversário de uma das estrelas do elenco, Candice Bergen. Que tem outras grandes frases além desta: Gosto de pensar que inteligência seja contagiosa. Infelizmente, não é !

Parece-me que é a primeira vez que Candice faz teatro. Ela se tornou uma senhora matrona e pesada, mas fez uma plástica que lhe devolveu o mesmo rosto bonito da juventude.
Ela faz a esposa separada do outro candidato que é John Larroquete, mas que voltou para apoiá-lo na campanha eleitoral.

Nem é preciso dizer que a peça foi montada porque este é o exato momento em que estão ocorrendo as convenções republicanas (a peça não diz qual é o partido, mas tudo indica ser o Democrata, até porque é uma licença poética ter tido um presidente negro nos anos 50, como seria o caso de Earl Jones. Ele só foi presidente americano num telefilme).

Toda a encenação é como se fosse a convenção e até as indicadoras de lugar usa um chapeuzinho das cores norte-americanas. Tem um locutor e as imagens ainda em preto e branco. Embora a maior parte da ação se passe nos apartamentos do hotel.

O, geralmente, humorista Larroquete faz com competência o ex-secretário de Estado William Russell, que tem um defeito grave para político, não sabe e não gosta de mentir.

Culto e inteligente (ou seja, mais dois defeitos), ele não quer usar golpes sujos, mas é obrigado a agir quando o rival ameaça usar um arquivo médico que fala de seus problemas quando teve uma crise de nervos.

O elenco é enorme (28 pessoas) e hoje na Broadway quase não tem diferença de preço entre musical e peça normal, está tudo perto dos 150 dólares por ingresso (eu tive que pagar 200 por caixeiro viajante porque está lotando). Mas considerando o preço de shows no Brasil não há nada de se estranhar.

Deixa eu falar o, porém das decepções: O ponto fraco da montagem é a presença de Erin McCormack da série de TV Will e Grace, que é o político ambicioso. Fique mal impressionado com sua figura. Ele baixo, muito fraco, não tem porte ou presença.

É leve demais para fazer bandido e erra totalmente na escolha de como fazer o que seria o vilão, aquele que é capaz de tudo para vencer, usando todas as armas. Mas ele faz o personagem sem humanidade, já se vê que é bandido na primeira cena e vai assim até o final.

Pode ter sido a linha que lhe deu o diretor no caso Michael Wilson (nada de notável em seu currículo) porque a atriz que faz sua esposa (Kerry Butler, vinda de musicais como Xanadu, Catch Me If You Can) está caricata e ridícula.

Pode ser que o texto tenha muitas coisas datadas, mas achei ele pertinente, porque o mundo e a política como se bem sabe só piorou. Por que Gore não escreve mais para o teatro, é uma pena. Como foi um prazer confirmar minha admiração por Earl Jones e rever Ângela.


Rubens Ewald Filho

Crítico de cinema

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