Avaliação: nota 8
 
 


Não há dor pior do que a advinda da perda de um filho. E quando esse filho se suicidou depois de assassinar cerca de vinte pessoas, entre alunos e professores, de sua faculdade em um massacre de enorme repercussão em todo o País? Pois é exatamente essa contraditória dor que “Tarde Demais” busca demonstrar ao retratar a dura rotina de luto dos pais de um universitário autor de um ato psicótico. Em sua estreia como diretor, Shawn Ku realiza um filme sensível, cheio de questionamentos e algumas respostas, enquanto outras permanecem em aberto. Afinal, não há explicação lógica para crimes como esse.

Nem mesmo Michael Moore foi capaz de explicar em sua investigação minuciosa e por vezes demasiadamente acusadora em seu premiado documentário “Tiros em Columbine”. A temática também já foi retratada por Gus Van Sant, que na obra-prima “Elefante” exibe, em estilo extrema e assustadoramente documental, os momentos de horror vividos por estudantes de mais uma faculdade vítima de um massacre orquestrado por dois de seus alunos. No entanto, nem Sant nem Moore “optaram” (as aspas servem apenas para o caso de Moore) por ficcionalizar ou entrevistar os maiores acusados pela sociedade: os pais do louco, do maníaco, do assassino ou apenas de um perturbado garoto em busca de atenção.

E não pense que em “Tarde Demais” Sammy (Kyle Gallner), o filho, é descrito apenas como esse tímido rapaz por seus pais, Kate (Maria Bello) e Bill (Michael Sheen). O casal também permite-se indignar e chamá-lo da mesma forma que todo o abalado povo norte-americano, ainda que de maneira branda. Primeiramente, no entanto, o roteiro do próprio Shawn Ku e Michael Armbruster os faz duvidar. A dificuldade em reconhecer o garoto devido ao tiro no rosto que ele mesmo deu é onde Kate se segura antes de encarar a dura realidade. A partir de então, a vida de ambos vira de cabeça para baixo. O trabalho é deixado de lado temporariamente e o assédio dos jornalistas força-os a abandonarem a própria casa e serem abrigados pelo irmão de Kate.

Como dizem: “a ficha não cai” instantaneamente. A história escolhe um ritmo mais lento e concede a seus personagens tempo para encararem de vez o fato de frente. E quando isso finalmente acontece, “Tarde Demais” se torna um filme bastante dolorido. As crises de choro, que ocorrem em qualquer lugar (da cama à mesa do restaurante), são intercaladas por questionamentos acerca da própria criação que proporcionaram a Sammy. “Houve algo de errado em sua educação?”, perguntam-se constantemente Kate e Bill, que inicialmente, em um grande acerto do filme, encontram uma resposta negativa.

A trama, então, concede ao espectador o direito de julgar ao analisar a rotina do casal: a maneira como Kate sufoca o sobrinho, em um possível exemplo de superproteção; as constantes ausências de Bill, que troca o lar pelo lazer em plena praça da cidade; e a forma ora conturbada ora amigável em que os dois se relacionam, resultando no já firmado divórcio. Cabe ao público julgar se esses fatos são suficientes para justificarem tamanha tragédia. Se não, o roteiro ainda abre espaço para culparmos a natureza do rapaz, com quem temos um pequeno, mas dispensável contato. Inúteis offs e cenas que exibem as últimas palavras trocadas entre família e o bullying sofrido por Sammy na faculdade prejudicam a universalização da história, mesmo que não permitam um total entendimento do que se passava em sua cabeça.

A câmera na mão de Shawn Ku, sempre em busca dos rostos de seus protagonistas, exibem os momentos de instabilidade vivida por eles, em uma escolha técnica que por vezes compensa a pouca interiorização almejada, mas não alcançada pelo roteiro. Michael Sheen e Maria Bello, em interpretações estupendas, transmitem com sucesso a dor sentida pelos pais do garoto, mantendo-se aparentemente firmes nos primeiros momentos, mas definhando aos poucos, deixando-se envolver por um sentimento com que terão de aprender a conviver, já que o “porquê?” pode nunca encontrar uma devida resposta.
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Darlano Dídimo é crítico do CCR desde 2009. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é adorador da arte cinematográfica desde a infância, mas só mais tarde veio a entender a grandiosidade que é o cinema.