Adaptado de HQ cuja visão do futuro traz um mundo devorado pelo avanço tecnológico, “Substitutos” nasce de um conceito fantástico, mas a solidez de sua trama é condensada por exercício de ação burocrático. O que resiste, ao fim, é um entretenimento passageiro.
É frustrante, quase insuportável, quando algo como “Substitutos” acontece. Iniciando-se em meio à estética instigante e trama envolvente, o filme cativa inicialmente pela natureza de seu conceito arrebatador. O mundo futurístico retratado aqui provém da HQ homônima e, recheado de implicações morais das mais interessantes, vai construindo uma realidade palpável e subversiva. Toda aquela atmosfera inicial pungente, porém, incontestável em qualquer grande filme de ficção-científica, é quase totalmente desperdiçada quando a película aciona o piloto automático. Daí em diante, é ladeira abaixo. E, até o desfecho, o máximo que pode ser extraído da obra é diversão gratuita, o que é frustrante para um projeto que, em sua meia-hora inicial, provocava os mais sensacionais dos questionamentos em seu detalhamento sóbrio de um futuro desumano.
O filme é baseado na graphic novel de Robert Venditti e Brett Weldele, e traz em seu enredo uma espécie de conto futurístico que lembra muito os trabalhos realizados pelo mestre do gênero Philip K. Dick, que por sua vez já foi exaustivamente adaptado para os cinemas. Os créditos iniciais do longa situam o espectador na história: com o avanço tecnológico, foi engenhada uma forma para que os humanos se protejam do mundo de fora. Foram criados clones robóticos que, podendo ser controlados por dentro do conforto de casa pelos humanos, funcionariam como substitutos dos mesmos ao encarar o mundo de fora. Os robôs surgem como representações perfeitas dos mesmos, personalizados mediante a situação financeira do ser, e começam a popular um mundo em que o crime, o medo e a dor deixam de existir.
Isso explicado, a trama de “Substitutos” engrena quando o primeiro assassinato em muitos anos abala o departamento de polícia. Somos introduzidos então ao detetive Tom Greer (Bruce Willis), que lidera a investigação do crime que, em sua intensidade, pode provocar consequências devastadoras para a utopia que vem sendo idealizada com o surgimento dos substitutos. Neste meio tempo, o roteiro escrito por Michael Ferris e John D. Brancato (que assinaram filmes tão diversos quanto “Mulher-Gato” e “Femme Fatale”), utiliza bem os elementos que compõem o futuro retratado.
A película é especialmente incisiva em certos detalhes que abordam de forma bastante cínica as atitudes do ser humano em um mundo que, em sua banalidade, se tornou desconectado de emoções humanas. Isso é bastante perceptível nos momentos que focam o relacionamento frio que tomou conta de Greer e de sua esposa. A esposa de Greer, aliás, assume a aparência perfeita que lhe é permitida como um robô substituto, mas provoca o choque quando, no clímax da obra, descobrimos sua verdadeira aparência.
São os pequenos detalhes que mantém “Substitutos” vivo, já que não delonga até que os roteiristas acionem a fórmula e enviem o longa-metragem de tanto potencial direto para o lugar comum. A trama policial que toma conta da metragem é simplista e, em seu desenvolvimento, pouco eficiente. A presença de Bruce Willis, porém, não deixa a desejar, e é inegável o quanto este continua a ser um competente astro de ação quando lhe é requerido. Então, por causa do fator humano que é composto pela atuação sincera de Willis, o desenvolvimento burocrático não provoca um completo declínio da narrativa do filme. Algo até bastante difícil já que, apesar de terríveis derrapadas e inconsistências, a direção de Jonathan Mostow (“O Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas“) permanece sempre segura e vagamente interessante, segurando o envolvimento da audiência mesmo quando a trama parece perder o fôlego.
Há sequências em “Substitutos”, como o que traz Tom Greer diante de uma escolha que decidirá o futuro da humanidade, que ecoa o verdadeiro poder (e relevância) de uma bela ficção-científica. Mas, infelizmente, isto ocorre muito pouco. Os momentos mais bem compostos parecem nascer de ideias geniais que, por sua vez, parecem vir direto do material original. Ficou a cargo dos roteiristas apenas a tarefa de dar rumo à estas ideias e, à Mostow, entregá-las vida. Pode-se dizer, com bastante segurança, que “Substitutos” não faz jus ao seu potencial. Então, por mais hipnotizante que possa ser sua imagem final, o gosto amargo que lhe é deixado ao fim não provém da história do filme (cujas implicações nunca são bem texturadas), mas do efeito irremediável de que você está diante de um trabalho frustrante em seu desapontamento.
Para os fãs do gênero, “Substitutos” vai deixar saudade de filmes como “O Homem Duplo” e, especialmente, “Minority Report: A Nova Lei”. Mas para um público que vai ao cinema à procura de um mero filme de ação, o longa-metragem de Jonathan Mostow pode corresponder. De fato, a obra entretém, em maior ou menor grau, em seus curtos oitenta e poucos minutos. Mas é um divertimento passageiro e nebuloso, sem uma composição conclusiva ou mensagem provocativa. Com o material que tinha em mãos, é um filme que deveria mandar o espectador para fora arrepiado. Mas, com sua falta de ambição, se contenta com seus belos efeitos especiais e ótimas sequências de ação, diluindo o que poderia ter sido uma discussão eletrizante sobre o valor da humanidade e o desgaste de um mundo afundado na perdição da tecnologia. O que “Substitutos” falha em desenvolver, a animação “Wall-E” incitou em meros minutos.
Wallysson Soares
cinemacomrapadura.com.br
É frustrante, quase insuportável, quando algo como “Substitutos” acontece. Iniciando-se em meio à estética instigante e trama envolvente, o filme cativa inicialmente pela natureza de seu conceito arrebatador. O mundo futurístico retratado aqui provém da HQ homônima e, recheado de implicações morais das mais interessantes, vai construindo uma realidade palpável e subversiva. Toda aquela atmosfera inicial pungente, porém, incontestável em qualquer grande filme de ficção-científica, é quase totalmente desperdiçada quando a película aciona o piloto automático. Daí em diante, é ladeira abaixo. E, até o desfecho, o máximo que pode ser extraído da obra é diversão gratuita, o que é frustrante para um projeto que, em sua meia-hora inicial, provocava os mais sensacionais dos questionamentos em seu detalhamento sóbrio de um futuro desumano.
O filme é baseado na graphic novel de Robert Venditti e Brett Weldele, e traz em seu enredo uma espécie de conto futurístico que lembra muito os trabalhos realizados pelo mestre do gênero Philip K. Dick, que por sua vez já foi exaustivamente adaptado para os cinemas. Os créditos iniciais do longa situam o espectador na história: com o avanço tecnológico, foi engenhada uma forma para que os humanos se protejam do mundo de fora. Foram criados clones robóticos que, podendo ser controlados por dentro do conforto de casa pelos humanos, funcionariam como substitutos dos mesmos ao encarar o mundo de fora. Os robôs surgem como representações perfeitas dos mesmos, personalizados mediante a situação financeira do ser, e começam a popular um mundo em que o crime, o medo e a dor deixam de existir.
Isso explicado, a trama de “Substitutos” engrena quando o primeiro assassinato em muitos anos abala o departamento de polícia. Somos introduzidos então ao detetive Tom Greer (Bruce Willis), que lidera a investigação do crime que, em sua intensidade, pode provocar consequências devastadoras para a utopia que vem sendo idealizada com o surgimento dos substitutos. Neste meio tempo, o roteiro escrito por Michael Ferris e John D. Brancato (que assinaram filmes tão diversos quanto “Mulher-Gato” e “Femme Fatale”), utiliza bem os elementos que compõem o futuro retratado.
A película é especialmente incisiva em certos detalhes que abordam de forma bastante cínica as atitudes do ser humano em um mundo que, em sua banalidade, se tornou desconectado de emoções humanas. Isso é bastante perceptível nos momentos que focam o relacionamento frio que tomou conta de Greer e de sua esposa. A esposa de Greer, aliás, assume a aparência perfeita que lhe é permitida como um robô substituto, mas provoca o choque quando, no clímax da obra, descobrimos sua verdadeira aparência.
São os pequenos detalhes que mantém “Substitutos” vivo, já que não delonga até que os roteiristas acionem a fórmula e enviem o longa-metragem de tanto potencial direto para o lugar comum. A trama policial que toma conta da metragem é simplista e, em seu desenvolvimento, pouco eficiente. A presença de Bruce Willis, porém, não deixa a desejar, e é inegável o quanto este continua a ser um competente astro de ação quando lhe é requerido. Então, por causa do fator humano que é composto pela atuação sincera de Willis, o desenvolvimento burocrático não provoca um completo declínio da narrativa do filme. Algo até bastante difícil já que, apesar de terríveis derrapadas e inconsistências, a direção de Jonathan Mostow (“O Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas“) permanece sempre segura e vagamente interessante, segurando o envolvimento da audiência mesmo quando a trama parece perder o fôlego.
Há sequências em “Substitutos”, como o que traz Tom Greer diante de uma escolha que decidirá o futuro da humanidade, que ecoa o verdadeiro poder (e relevância) de uma bela ficção-científica. Mas, infelizmente, isto ocorre muito pouco. Os momentos mais bem compostos parecem nascer de ideias geniais que, por sua vez, parecem vir direto do material original. Ficou a cargo dos roteiristas apenas a tarefa de dar rumo à estas ideias e, à Mostow, entregá-las vida. Pode-se dizer, com bastante segurança, que “Substitutos” não faz jus ao seu potencial. Então, por mais hipnotizante que possa ser sua imagem final, o gosto amargo que lhe é deixado ao fim não provém da história do filme (cujas implicações nunca são bem texturadas), mas do efeito irremediável de que você está diante de um trabalho frustrante em seu desapontamento.
Para os fãs do gênero, “Substitutos” vai deixar saudade de filmes como “O Homem Duplo” e, especialmente, “Minority Report: A Nova Lei”. Mas para um público que vai ao cinema à procura de um mero filme de ação, o longa-metragem de Jonathan Mostow pode corresponder. De fato, a obra entretém, em maior ou menor grau, em seus curtos oitenta e poucos minutos. Mas é um divertimento passageiro e nebuloso, sem uma composição conclusiva ou mensagem provocativa. Com o material que tinha em mãos, é um filme que deveria mandar o espectador para fora arrepiado. Mas, com sua falta de ambição, se contenta com seus belos efeitos especiais e ótimas sequências de ação, diluindo o que poderia ter sido uma discussão eletrizante sobre o valor da humanidade e o desgaste de um mundo afundado na perdição da tecnologia. O que “Substitutos” falha em desenvolver, a animação “Wall-E” incitou em meros minutos.
Wallysson Soares
cinemacomrapadura.com.br
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