sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Julie e Julia


"O desafio: 524 receitas em 365 dias. A desafiante: Julie Powell , funcionária do governo de dia, gourmet renegada pela noite". Registrar num blog a experiência de fazer todas as receitas do livro Dominando a arte da culinária francesa da famosa chef Julia Child no prazo de um ano.

Esse foi o primeiro passo para Julie (Amy Adams), montar um blog que ficou entre os mais populares da época. Enquanto isso — bem aos moldes das montagens paralelas clássicas — acompanhamos, cinquenta anos antes, a própria Julia Child (Meryl Streep) chegando à Paris com seu marido Paul (Stanley Tucci) e suas reinações até se tornar o mito culinário que popularizou a cozinha francesa entre as donas de casa americanas.

A diretora Nora Ephron tem um currículo bem, digamos, eclético. É roteirista dos bons Harry & Sally e Silkwood – Retrato de uma coragem, dirigiu o mediano Mensagem para você, os fracos Michael, anjo sedutor e A feiticeira, entre outros. Mas na junção, parece ter finalmente acertado a mão com Julie & Julia. O roteiro da própria diretora baseado nos livros Minha vida na França, de Julia Child e Alex Prud'homme, e Julie & Julia de Julie Powell não tem nada de muito original já que a mesma premissa fora usada em As horas. Mas o que inova é o fato de ser o primeiro filme comercial a ser baseado num blog, já que o livro de Powell é a transcrição de seu próprio desafio publicado diariamente na internet.

Com belíssimas tomadas que conseguem igualar o charme cru do bairro do Queens, em Nova York, à opulência de Paris, a câmera da diretora passeia leve pela história como um árbitro de futebol que apita direitinho sem ter que aparecer mais que o jogo. O elenco não fica para trás, o "núcleo" da Grande Maçã é bem competente sem chegar a ser brilhante, enquanto que Meryl Streep despida de vaidade sem usar nariz falso para isso — o que convenhamos não é para qualquer atriz — já consegue uma aproximação digna de uma conferida, mesmo que sua personagem volta e meia lembre Terry Jones do Monty Python imitando uma mulher. Mas não se enganem, Julia Child falava assim mesmo, para quem não conhece é só dar uma olhadela no You Tube.

Tirando alguns vários anacronismos temporais, a produção como um todo também não decepciona, entregando um filme gostoso de assistir, apesar de longo demais, romântico — chamem-me de sentimental saudosista, mas Mery Streep alisando a barriga de Stanley Tucci na cama traz boas recordações do romantismo simples tão deixado de lado pelo cinema nos últimos tempos — e ao mesmo tempo engajado politicamente, com dezenas de metáforas em geral com comida.

Vai agradar com certeza todos os fãs de culinária, em especial a francesa. Assim como facilmente vai desagradar republicanos e os mais radicais defensores dos animais — uma certa cena envolvendo lagostas chega a ser cruel — mas tirando isso, o filme apesar de não ser memorável, é um agradável passatempo para o público em geral, com alguns poucos momentos que se destacam além da média. Por exemplo, a diminuição daquelas conclusões dramatizando e aumentando o que de fato não aconteceu pode até frustrar alguns, mas talvez seja o indicativo de uma maturidade querendo tomar corpo no cinemão comercial. Mas provavelmente será sufocada logo nas próximas produções.


Por Vander Colombo

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