Dom, 29 de maio de 2011 - 14h05
O Poder e a Lei: entre no mundo arriscado dos casos judiciais
Abismo criado para protagonista canastrão é o principal atrativo de adaptação literária.
Avaliação: NOTA 7
A rotina agitada nos tribunais já foi levada às telonas inúmeras vezes. Homens fortes defendem ou acusam os réus com seus jogos de cena, na tentativa de impressionar o júri. Entre os clássicos que nos mostraram com competência esse universo naturalmente cheio de reviravoltas estão “Anatomia de um Crime” (1959), “Testemunha de Acusação” (1957) e “O Sol é Para Todos” (1962). Entre os mais recentes, “Em Nome do Pai” (1993), “Filadélfia” (1993), “Erin Brockovich” (2000), “Chicago” (2002) e “A Vida de David Gale” (2003) levam ao público os trâmites dos tribunais, sempre mostrando a figura forte da representação jurídica meio a casos complicados ou impossíveis de solucionar.
Antes mesmo de protagonizar “O Poder e a Lei”, Matthew McConaughey já defendeu na justiça a liberdade humana em “Amistad” (1997), clássico de Steven Spielberg que também mostra um sistema conflituoso no meio jurídico. Agora nas mãos de Brad Furman, McConaughey vira o foco principal do longa e deixa de lado o visual garotão com prancha de surfe na mão das comédias românticas para vestir o paletó e investigar um caso curioso. No filme inspirado na obra “Advogado de Porta de Cadeia”, de Michael Conelly (leia a análise do livro), o ator interpreta Mickey Haller, um advogado esperto que conquistou a fama ao defender prostitutas e criminosos na justiça, sendo visto muitas vezes como uma escória entre seus colegas de trabalho por libertar quem merecia estar na prisão ou reduzir as penas.
Se relacionando com clientes “barra pesada”, a questão da grana sempre pesou no bolso de Mickey, que muitas vezes se aproveita de sua inteligência para encher a conta bancária. Seu escritório pessoal, geralmente dentro do carro Lincoln (daí o título original, “The Lincoln Lawyer”), o advogado vê uma grande oportunidade de fazer dinheiro fácil quando seu colega de trabalho Fernando Valenzuela (John Leguizamo) oferece a ele o caso do playboy Louis Roulet (Ryan Phillippe), acusado de estupro e espancamento de uma prostituta. Aparentemente inocente, a história vai se mostrando mais obscura com o passar da projeção, invertendo todo o poder que Mickey cria sob o caso e o colocando em um fogo cruzado.
O roteiro de John Romano tenta aproveitar o máximo da obra original e preserva a tensão no decorrer dos atos, preparando os espectadores para as reviravoltas. Ainda que tente desenvolver uma trama didática, sem muito apelo aos jargões jurídicos para que todo tipo de público possa acompanhar bem a história, o trato com os personagens cai na superficialidade, talvez por tal excesso de didatismo. Há um subaproveitamento dos personagens que colaboram para desconstruir o que aconteceu com Louis Roulet. Um exemplo disso é a inserção de Jesus Martinez (Michael Pena), que surge de maneira forçada para criar ligações com o caso de Louis e dar resoluções (quase) fáceis a Mickey.
Outro que sai prejudicado é John Leguizamo, que não tem sua função bem estabelecida durante o longa. A partir do segundo ato, sua aparição se resume a ligações telefônicas, sem mesmo criar um mistério sobre a fidelidade dele a Mickey. Josh Lucas e os detetives do segundo ato entram de supetão na trama, sem nos ser apresentados de uma forma que fixemos sequer seus nomes. O elenco ainda conta com Marisa Tomei, interpretando a ex-esposa de Mickey, e Willian H. Macy, seu fiel investigador e peça fundamental para a solução do caso.
O filme, entretanto, é focado especialmente em Mickey. Não que McConaughey seja um ator bom ou ruim, há controvérsias, mas é difícil comprá-lo em um filme completamente sério em que a empatia do protagonista é essencial. O ator consegue tal feito, principalmente por ser canastrão ao ponto de ganhar nosso apreço, mesmo se estabelecendo como um corrupto em alguns momentos. Seu contraponto, vivido por Ryan Phillippe, funciona nos primeiros minutos de projeção, quando precisa se defender das acusações e se fazer acreditar pelo advogado de defesa. Entretanto, sua performance cai aos poucos quando é necessária uma maior dimensão do papel.
O roteiro estabelece muito bem a gradação das reviravoltas que levam ao clímax do longa, dando material forte para que McConaughey desenvolva o abismo em que seu personagem vai caindo. Aliado ao diretor pouco conhecido Brad Furman, o resultado é em sua maior parte positivo. Furman tem um bom desempenho até mesmo ao abusar dos closes em McConaughey que tentam revelar seu emocional, nem sempre conseguindo. Esse paradoxo torna o personagem mais interessante. O diretor também tem boas sacadas visuais e é auxiliado por uma edição dinâmica.
Ainda que não se torne um exímio exemplar de filmes de tribunal, “O Poder e a Lei” se estabelece como uma boa surpresa nesta temporada, já que o seu material original revela com grandiosidade essas relações judiciais controversas e, às vezes, perigosas. Temos um bom panorama sobre a figura máscula e inteligente do advogado, ainda que outros filmes tenham se destacado mais na construção (ou desconstrução) desse herói(?). De toda forma, entre os blockbusters que já antecedem o período de férias no Brasil, um simples drama como “O Poder e a Lei” chama atenção. Isso já vale o ingresso.
___
Diego Benevides é editor geral, crítico e colunista do CCR. Jornalista graduado pela Universidade de Fortaleza (Unifor), atualmente é pós-graduando em Assessoria de Comunicação e estudioso em Cinema e Audiovisual. Desde 2006 integra a equipe do portal, onde aprendeu a gostar de tudo um pouco. A desgostar também.
Diego Benevides é editor geral, crítico e colunista do CCR. Jornalista graduado pela Universidade de Fortaleza (Unifor), atualmente é pós-graduando em Assessoria de Comunicação e estudioso em Cinema e Audiovisual. Desde 2006 integra a equipe do portal, onde aprendeu a gostar de tudo um pouco. A desgostar também.
Nenhum comentário:
Postar um comentário