Avaliação: NOTA 6
 
 


É inevitável que a Justiça, administrada por homens falhos, cometa erros. A arrogância e a teimosia humana, bem como nossos próprios preconceitos, só fortalecem tal possibilidade. De tais equívocos, podem surgir tragédias desoladoras e triunfos inesquecíveis.

Baseado em uma história real, “A Condenação” tem um pouco dos dois. Dirigido por Tony Goldwyn, o longa traz Hillary Swank como Betty Anne Waters, mãe de família que resolve encarar tudo e todos ao entrar na faculdade de Direito para se tornar advogada e tentar inocentar seu irmão, Kenny (Sam Rockwell), condenado à prisão perpétua por um crime que ele afirma não ter cometido.

O roteiro, escrito por Pamela Grey, adota uma narrativa não-linear em seu início para nos apresentar à situação dos irmãos e de como se deu a prisão de Kenny. Esse primeiro ato estabelece bem a relação dos protagonistas, mas pesa a mão em dados momentos, principalmente ao forçar uma simpatia para com Kenny com seus atos “engraçadinhos”, como o strip no bar após o rapaz ter agredido um homem que falou um palavrão na frente de sua filha durante uma discussão de bar.

Apesar de ser compreensível a necessidade de fazer com que o amor de Betty Anne pelo irmão seja palpável para o público, ficamos mais atônitos com sua incapacidade em repreender Kenny em sua “maturidade” do que admirados com o carinho dela. Bem mais eficazes em estabelecer a cumplicidade entre os personagens são os pequenos flashbacks que nos mostram a difícil infância da dupla e seus anseios por um lar mais normal.

No final das contas, o que faz com que o elo entre os irmãos acabe por funcionar junto ao público é realmente a boa química entre Hillary Swank e Sam Rockwell. A ternura com a qual a atriz encara seu parceiro de cena em momentos mais íntimos “vendem” melhor a relação entre os dois do que os pontos mais exagerados, como a já citada sequência do bar. Já o trabalho de Rockwell e sua energia habitual salvam Kenny de se tornar uma mera caricatura, concedendo intensidade aos seus momentos dramáticos, como a sequência na qual ele é imobilizado por alguns guardas.

O trabalho de Swank concede mais robustez ao ponto forte do filme, que é a verdadeira guerra travada por Betty Anne contra o sistema, mostrando muito bem a dificuldade e a frustração de se batalhar contra a burocracia, bem como a teimosia de certos operadores do direito, mais interessados em glória pessoal do que em justiça.

Alguns clichês pontuais atrapalham o andamento da trama, como a reação absurda do marido de Betty Anne ao saber que sua esposa fará o curso de Direito e a óbvia briga da personagem com os filhos por não lhes dar a atenção que eles requerem, mas a história consegue navegar relativamente bem nestes chavões.
O elenco ainda conta com Juliette Lewis que, surgindo um tanto exagerada, interpreta uma ex-namorada de Kenny cujo depoimento ajuda a colocá-lo na prisão. Já Melissa Leo, no papel da policial Nancy Taylor, não tem tempo em cena para desenvolver melhor seu papel, resultando em uma antagonista extremamente unidimensional, sem a mínima motivação para seus atos, em um dos grandes tropeços da produção. Completam a trupe Minnie Driver, como a melhor amiga de Betty Anne, Abra, e Peter Gallagher, como um ativista do direito, ambos corretos e só.

Mais conhecido por seus trabalhos para a televisão, o diretor Tony Goldwyn entrega uma fita visualmente sóbria, reconhecendo que este é o tom mais adequado para a produção, auxiliada por uma fotografia que tende para tons mais frios. O visual do filme eventualmente contrasta com sua trilha sonora que, assim como o roteiro, cede em alguns pontos para o sentimentalismo barato.

A montagem começa meio trôpega, graças ao já citado primeiro ato da fita, mas consegue dar ritmo, mesmo com algumas elipses que surgem sem o devido impacto. A maquiagem dos atores funciona muito bem em ilustrar a passagem de duas décadas que ocorre durante a projeção, com exceção de Hillary Swank, que não ganha uma só ruga o filme inteiro. Mesmo com suas falhas, “A Condenação” é efetivo no que se propõe, devendo muito de seu resultado final às atuações de Swank e Rockwell.
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Thiago Siqueira
 é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.