O Espião que Sabia Demais: longa de espionagem rende boas atuações
Baseado em romance do escritor John Le Carré, filme traz Gary Oldman em trama ambientada nos anos 70 sobre traição e assassinatos em pleno Serviço Secreto de Inteligência Britânico.
Avaliação: NOTA 7
Durante boa parte dos filmes de ação e espionagem que imperaram nos anos da Guerra Fria (1947 – 1991), os soviéticos foram os grandes vilões da Sétima Arte. O cinema, especialmente hollywoodiano, se limitava a culpar a URSS em grande parte de suas películas, alimentando o imaginário do público que assistia de camarote a uma guerra (aparentemente) silenciosa. O medo generalizado diante de uma Alemanha dividida e do conflito armado de mísseis na tríplice União Soviética, EUA e Cuba incomodaram uma sociedade que se dividia entre render-se ao Capitalismo, abraçar com riscos a bandeira vermelha do Comunismo ou, mais seguro e majoritário, abster-se e assistir em silêncio a uma provável Terceira Guerra Mundial.
Em “O Espião que Sabia Demais”, longa baseado em romance homônimo do escritor britânico John Le Carré e dirigido pelo cineasta sueco Tomas Alfredson (do terror “Deixe Ela Entrar”) acompanhamos, em meados dos anos 70, um grupo de agentes do Serviço Secreto de Inteligência Britânico que se envolve em uma trama de gato e rato quando emergem suspeitas de um agente duplo entre eles, que estaria fornecendo informações sigilosas tanto aos britânicos como aos soviéticos.
Quem enfrenta os riscos de descobrir a verdade é um experiente membro da equipe, conhecido como Control (John Hurt) que, após enviar um dos seus colegas a uma mal sucedida operação na Hungria, tem de contar com o colega aposentado George Smiley (Gary Oldman) para investigar a sujeira debaixo do tapete da renomada instituição. Se confirmada, a infiltração poderia mudar os rumos da Grã Bretanha no conflito.
Nesta busca pela “maçã podre da cesta”, Smiley entrará em um confronto, inicialmente velado, com a grande cúpula do Serviço de Inteligência, formado por Bill Haydon (Colin Firth), Percy Alleline (Toby Jones), Roy Bland (Ciarán Hinds) e Toby Esterhase (David Dencik). Todos ali são suspeitos de cooperar com a operação Witchcraft, grande jogada do oponente que envolve assassinatos, política e, claro, dinheiro.
Com a ajuda de Peter Guillam (Benedict Cumberbatch) e das pistas deixadas por Control, Smiley vai ligando os pouquíssimos rastros que o levam a Ricki Tarr (Tom Hardy), um elemento importante – e mais humano – que se envolve com Irina (Svetlana Khodchenkova), soviética intimamente ligada ao chefe do Serviço de Inteligência de Moscou, tornando-o mais um suspeito da traição. Neste emaranhado de personagens, o quebra-cabeça vai se formando a conta-gotas, onde nada é entregue de bandeja ao público até os momentos finais em um filme sério, adulto e intrigante.
Com uma cadência lenta que, paradoxalmente, não perde o ritmo, Alfredson cria um filme bem acabado e roteirizado, que mantém a tensão constante ao fornecer pistas que não somente instigam o espectador, mas também embaralham as suspeitas. Trocando em miúdos, é como tentar uma criança diante de um doce que ela terá de esperar para saborear. E diante de tal suspense, todos em “O Espião que Sabia Demais” são inimigos e suspeitos em potencial, com acesso a informações sigilosas do inimigo, ligações telefônicas em russo dos agentes britânicos, segredos pessoais que podem pôr tudo a perder e aí por diante.
A direção firme e as atuações críveis dos atores (em especial do trio Oldman, Hurt e Hardy) fazem com que a película não se perca em seu labirinto de eventos, especialmente pelo vai e vem cronológico, um caminho que, quando não bem trabalhado, pode ser fatal. Créditos para a edição, visto que o filme não deixa a desejar também com relação à direção de arte e fotografia, carregada de tons de cinza e detalhes esfumaçados, onde até mesmo os momentos de maior descontração transpiram mistério, tensão e desconfiança.
O resultado deve agradar aos fãs do gênero, em um filme que, por conta da frieza dos personagens, pode não criar empatia com o público, acostumado a torcer – contra ou a favor – por seus personagens. Assim, o sentimento de indiferença é capaz de permear as pouco mais de duas horas de projeção. Isso, claro, não tira todos os créditos de “O Espião que Sabia Demais”, porém a distância recíproca personagens/espectador não evolui, como se todo seu enredo tenha sido criado para contemplar e não emocionar.
O resultado deve agradar aos fãs do gênero, em um filme que, por conta da frieza dos personagens, pode não criar empatia com o público, acostumado a torcer – contra ou a favor – por seus personagens. Assim, o sentimento de indiferença é capaz de permear as pouco mais de duas horas de projeção. Isso, claro, não tira todos os créditos de “O Espião que Sabia Demais”, porém a distância recíproca personagens/espectador não evolua, como se todo seu enredo tenha sido criado para contemplar e não emocionar.
John Le Carré, que co-assina a produção executiva e faz uma ponta no longa como convidado em uma festa de Natal, é autor de outras obras já adaptadas para a telona, como “O Alfaiate do Panamá”, “A Casa da Rússia” e “O Jardineiro Fiel”. Em “O Espião que Sabia Demais”, cujo título original “Tinker Tailor Soldier Spy” vem do trocadilho da rima britânica Tinker, Tailor / Soldier, Sailor, o autor retorna com seu personagem mais famoso, George Smiley, uma versão mais plausível de agente do MI6, área do Serviço Secreto responsável pelas investigações externas. E que é, diga-se de passagem, bem diferente do “colega de trabalho” James Bond, cujo histórico em enfrentar soviéticos com muitas explosões nada lembra o discreto Smiley, que leva nas costas um filme de espionagem discreto e sem grandiloquências, bem ao estilo britânico.
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Léo Freitas formou-se em Jornalismo em 2008 pela Universidade Anhembi Morumbi. Cinéfilo desde a adolescência e apaixonado por cinema europeu, escreve sobre cinema desde 2009. Atualmente é correspondente do CCR em São Paulo e desejaria que o dia tivesse 72 horas para consumir tudo que a capital paulista oferece culturalmente.
Léo Freitas formou-se em Jornalismo em 2008 pela Universidade Anhembi Morumbi. Cinéfilo desde a adolescência e apaixonado por cinema europeu, escreve sobre cinema desde 2009. Atualmente é correspondente do CCR em São Paulo e desejaria que o dia tivesse 72 horas para consumir tudo que a capital paulista oferece culturalmente.
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