The X-Files – Quase 20 anos de Conspiração – Season 4
Com vocês aquela que é considerada a melhor temporada de Arquivo X.
Aos que acharam a segunda a melhor temporada, ou aos que acharam a quinta a melhor delas, nenhum problema. A série não cometeu erros de condução até sua sexta temporada e como as duas primeiras serviram para estabelecer a ordem de exploração mitológica, somente na terceira e quarta temporadas é que eles estavam tranquilos para começar a brincar com os enredos. A terceira temporada foi muito fraca de episódios soltos e é só por isso que a quarta ganha dela em importância. A jornada número quatro é competente em todas as áreas.
Dois Globos de Ouro, alguns prêmios Emmy, Gillian e David finalmente vencedores nas categorias de atriz e ator, a mídia e o público aos pés da série. Foi mais ou menos por aí que o Brasil começou a dar atenção a série que era exibida há pouco tempo na Record (De fato a record começou a exibir a primeira temporada quando a segunda já terminava nos EUA. Algo entre 1994 e 1995, não encontrei fontes seguras a respeito). A emissora, longe de ser uma referência pra qualquer coisa na época, não conseguia acreditar na impressionante audiência que começou a obter. Enquanto os americanos viam a quarta temporada, os que não tinham a Fox (nos tempos em que a internet era um bebê e a TV por assinatura era para muito poucos) dependiam da Record para descobrir esse maravilhoso mundo dos arquivos inexplicáveis. A emissora, por mais audiência que tivesse, vivia mudando o programa de horário, mas ao menos não fazia como a Globo, que retalhava os episódios de suas séries e não exibia as aberturas originais. Daquele jeito meio torto a Record foi fiel aos fãs e exibiu The X-Files até o fim.
Eu morava numa área rural, muito pobre, do interior do Rio de Janeiro e lá a TV aberta era nossa única opção. Comecei a ver Arquivo X pela Record. Assisti um episódio da quarta temporada e gostei. Um ano depois, a quinta temporada acabou e eles começaram a exibir apenas os episódios mitológicos das temporadas anteriores (numa sacação incrível da Record, que com isso colocou novos fãs por dentro da trama central). Fiquei apaixonado e a partir daí começou o desespero para conseguir ver todos os episódios.
Além da Sci-Fi News, que falava muito da série e encontramos até hoje nas bancas, tinha uma revista só sobre Arquivo X, que saía a cada dois meses e que se chamava Arquivo X e Seriados.
O textinho, se alguém não conseguir ler, era esse: “Sou um muito humilde tarado por Arquivo X. Meu conhecimento não é tanto, pois moro num brejo e só agora consegui sintonizar a Record em minha casa. Socorram-me! Publiquem meu endereço para que eu possa me corresponder com outras pessoas e me sentir um pouco mais integrado”.
A publicação fez com que muitos outros fãs me escrevessem (de alguns sou amigo até hoje) e eu só consegui ver todos os episódios que estavam faltando por causa deles. Eu comprava fitas VHS virgens, enviava pra eles pelo correio, eles gravavam alguns episódios e me mandavam de volta. Esse foi o sistema até o final, na nona temporada.
Graças a Record (que ironicamente exibia uma série que questionava tudo que os donos do canal propunham) é que Arquivo X ganhou mais popularidade no Brasil e entrou na vida de um monte de gente. Essa quarta temporada é, então, um marco sob muitos aspectos.
“Procura incessante” - 4X01
Aquela que é considerada a melhor temporada da série se inicia com os eventos deixados pra trás em O Milagre. As questões genéticas levantadas em Jogo de Gato e Rato ganham outra dimensão quando ficamos sabendo que a raça alienígena tem sua força de resistência contra a colonização. O episódio tem sua força novamente em Mulder, quando ele dá de cara com uma versão de oito anos de sua irmã. Como em todo grande início de temporada para a série, temos muitas reviravoltas: a morte do informante “X”, a aparição de outro informante, a revelação de uma prévia relação entre o Canceroso e a mãe de Mulder… Enfim, o episódio é forte e nos prepara para a impressionante temporada que vimos desenrolando-se até então. O título original era Herrenvolk, uma palavra alemã que significa “raça maior” e faz analogia com os clones encontrados por Mulder. Uma das melhores frases da série também é dita nesse episódio: Nada acontece em contradição à natureza, mas em contradição ao que conhecemos dela.
Aberrações provocadas pelo incesto são o tema desse que foi o único episódio censurado da série. Mais uma vez, a dupla Morgan & Wong – de volta depois da ausência durante toda a temporada anterior – sai na frente e O Lar é disparado um dos momentos mais assustadores e ousados da televisão mundial. As cenas são desconcertantes, incômodas, nojentas… Mas é tudo tão corajoso e inteligente que não dá pra não assistir. Também é aqui que vemos a primeira menção às qualidades maternais de Scully, quando Mulder diz a ela que nunca a viu como uma mãe – a cena ajuda a redimir Carter do futuro da personagem – no momento em que a vê com um bebê no colo. O Lar é uma aula de ousadia e se não vale a pena por isso, vale por Gillian Anderson imitando o porquinho Babe no meio de uma cena.
Mais um de Morgan & Wong. A reencarnação é o foco nessa sensível história sobre o papel de cada um na sua vida. Uma mulher com um aparente problema de múltiplas personalidades esconde, na verdade, uma linha cruzada de vidas anteriores. Mulder acaba descobrindo uma rede de espíritos que o acompanha em todas as suas vidas. Belo e sombrio, o episódio tem um texto primoroso e uma força emocional impressionante para uma série de ficção científica.
Opa, Morgan & Wong de novo! Vocês devem achar que é piada, mas os caras são realmente muito bons. Aqui eles traçam um perfil interessante sobre o Canceroso. O fumante inveterado teria sido o assassino de Kennedy, de Luther King e mesmo assim, alimentava sonhos tolos sobre ser um grande escritor. O episódio é cheio de cenas memoráveis e ironias irresistíveis. É o penúltimo da dupla até aqui. Depois do também ótimo Nunca Mais, eles se despedem definitivamente dos roteiros de The X-Files, infelizmente.
Segunda parte de um bombástico episódio duplo que trouxe de volta Krycek e o óleo negro. Quem já leu o desbravador Eram os Deuses Astronautas? reconhece a Tunguska visitada por Mulder na primeira parte. Aqui em Terma, vemos o agente sendo exposto ao óleo e descobrindo mais uma vez que foi usado por Krycek, que trabalha – depois que foi abandonado pelo Canceroso – para os russos. O episódio também é famoso pela cena em que Krycek tem o braço amputado no meio da floresta de Tunguska. Trata-se de um daqueles épicos em duas partes que só X-Files fazia igual.
John Shiban aproveitou todas as histórias do Chupa-cabras que circulavam na mídia para escrever esse ótimo episódio que divide-se em dois pontos de vista distintos para a mesma história. Divertida e sagaz, a história pode não provocar identificação com a nossa versão do monstro, mas é um momento impecável do programa.
“Lembranças finais” – 4X15
Em O Homem do Câncer vimos o “comedor de cânceres”, Leonard Betts, dizer à Scully que “ela tinha uma coisa que ele queria”. Começa assim o arco dramático que daria à personagem o mesmo câncer sofrido pelas vítimas de abdução que ela conhecera em Os Japoneses. Aqui em Lembranças Finais, Scully atravessa a descoberta definitiva da doença enquanto Mulder tenta descobrir uma maneira de ajudá-la. O primeiro beijo entre os agentes teria acontecido aqui, mas foi cortado na edição final.
Somente selecionando as primeiras ou segundas partes dos episódios duplos é que seria possível manter essa lista com apenas 10 menções. Dito isso, a segunda parte de Lapso do Tempo toma a frente por uma razão muito simples: a sequência que explica o que aconteceu com Max Fanig dentro do avião é uma das coisas mais catárticas que eu já experimentei na televisão. Aqui temos a primeira vez em que Mulder fica cara a cara com um dos seres que ele tanto procura e também a consumação cada vez maior da doença que mata Scully aos poucos. Comentar apenas a segunda parte foi necessário, mas não posso esquecer de mencionar a festinha surpresa de Scully, organizada por Mulder, e que foi um dos poucos momentos de intimidade dos dois até aqui.
Uma experiência leva Mulder a começar a se lembrar de detalhes importantes dos eventos anteriores à abdução de sua irmã. Cenas difíceis entre ele a mãe anunciam a possibilidade cada vez maior de que a abdução de Samantha pode ter sido planejada por causa do “projeto”. Chris Owens volta a viver o Canceroso jovem – depois de Meditações – e prenuncia sua entrada definitiva no futuro do programa.
Como eu poderia descrever aquele que eu considero o melhor episódio de toda a história da série? São tantas as qualidades intelectuais desse episódio que eu até tenho medo de ficar pernóstico. Pra começar pela frase de abertura que muda para Believe the Lie.
E dentro desse conceito nos apresenta uma história em que nunca fica claro de que mentira realmente estamos falando. As que contam para esconder a verdade sobre os alienígenas ou as que contam para que acreditemos neles. John Fin – que já foi o pai do Pacey e andou revisitando Arquivos Mortos – entra em cena pra viver um dos grandes coadjuvantes da série, o cético Michael Kritschgau, que vem com a missão de provar a Mulder que ele vem acreditando num embuste sobre alienígenas para disfarçar as verdadeiras intenções do governo. A trama não é nada menos que genial! Os diálogos são uma aula de roteiro, temos a cena clássica da autópsia alienígena, temos Bill Scully botando a boca no trombone e tudo sendo coroado pela sequência final, com um Mulder devastado pela dúvida, cometendo um possível suicídio. Sua agonia se conecta ao título original do episódio que é Gethsemane, o nome do jardim onde Jesus passou sua última noite orando, antes da crucificação. E isso é só a primeira parte da trilogia de episódios mais impressionante que eu já tive a sorte de ter assistido na vida.
A quarta temporada foi a mais difícil para selecionar episódios bons e por consequência, também a mais difícil para apontar erros. A maioria dos episódios “ruins” eram apenas inferiores se comparados aos outros, mas ainda assim superiores a tudo que se via na TV.
Howard Gordon ainda é o campeão de roteiros frágeis e aqui decide entregar outra história sobre pessoas sendo “consumidas” pelas estranhas necessidades de aberrações mitológicas ou genéticas. Vimos isso muitas vezes na série, e continuaríamos vendo no futuro. Aqui não funcionou muito bem a trama com o “comedor de melaninas”.
Outro de Gordon. Como sempre, o problema não é a ideia em si, mas a condução dela. Aqui vimos um soldado que foi treinado com vietnamitas, aproveitando suas habilidades de “camuflagem” para se vingar. O episódio é extremamente irrelevante e desimportante para a natureza dos arquivos x, e parece ter sido produzido apenas para completar a temporada.
E Gordon fecha sua trilogia de enganos com mais um na lista de foras. Sincronia é sobre viagem no tempo. É bem verdade que foi a maneira menos óbvia de abordar o assunto, mas que caberia muito melhor numa série de fantasia da Warner do que num arquivo x. Os efeitos são bons e aquela atmosfera sombria ainda está ali, tímida, mas está. O problema é que novamente o caso é fraco, conduzido com desgaste e sem nenhum carisma. Daqueles episódios que se você não assistir não vai fazer a menor falta.
See you in the fifth season…
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