sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

As Viagens de Gulliver

 


 Falta personalidade e carisma a este filme, que só não fica menor ainda graças à presença de Jack Black.


Não tenho nada contra filmes simples com a batida (mas ainda válida) mensagem de “seja você mesmo”. Ninguém vai ao cinema conferir essas obras esperando Shakespeare. No entanto, uma coisa é fazer um roteiro mais leve, outra é produzir um texto idiota, com diálogos toscos e enchê-lo de propagandas de produtos do estúdio. Este é exatamente o caso de “As Viagens de Gulliver”, dirigido sem personalidade alguma por Rob Letterman em seu debut em produções live-action (ele recentemente comandou o eficaz “Monstros Vs. Alienígenas”).




Adaptada do clássico livro de Jonathan Swift – não dando crédito ao escritor, aliás -, a fita coloca Gulliver (Jack Black) como um contínuo de um grande jornal, o New York Tribune. Acomodado, Gulliver se enxerga como uma pessoa pequena, sem chances na vida e com a garota dos seus sonhos, Darcy (Amanda Peet), a editora do caderno de viagem do jornal.



 
Após acidentalmente se apresentar como escritor quando tentava chamar Darcy para sair, Gulliver acaba encarregado de fazer uma matéria no Triângulo das Bermudas e, após um acidente envolvendo um redemoinho, cai no reino de Lilliput, onde os habitantes possuem cerca de 10 cm de altura.

Tratado inicialmente como uma fera, Gulliver acaba fazendo amizade com o gentil fazendeiro Horatio (Jason Segel), que está apaixonado pela princesa Mary (Emily Blunt) e cai nas graças de todos ao defender o reino de uma invasão, para o desgosto do General Edward (Chris O’Dowd). A partir daí, o filme descamba para uma série de referências a longas e séries da própria 20th Century Fox, incluindo a hexalogia “Star Wars”, “X-Men Origens – Wolverine” e “Glee”, enquanto Gulliver tenta aproximar Horatio e a Princesa, com ares de um Cyrano de Bergerac roqueiro.

 
Como falei acima, uma coisa é um roteiro simples, outra é um texto sem lógica. Aceitar o Reino de Lilliput é parte da narrativa fantástica do filme, mas colocar uma editora de um grande jornal aceitando o texto de um contínuo sem experiência comprovada nenhuma e com o velho “copiar + colar” ou colocar os liliputianos construindo uma mansão à la Tony Stark para Gulliver em menos de uma semana é destruir a credibilidade do longa.

 A própria película teima em reduzir seus personagens a algo inferior a caricaturas. Mostrar os liliputianos como ingênuos seria algo condizente com a trama, mas ao colocar, por exemplo, Emily Blunt com o infeliz diálogo que conta com a fala “Estou sendo sequestrada” parece que o roteiro confunde ingenuidade com imbecilidade.

O surpreendentemente fraco script de Joe Stillman (“Shrek”) e Nicholas Stoller (“Sim Senhor!”) ainda apresenta momentos, no mínimo, esquisitos, como os inimigos dos liliputianos sendo amarrados como jogadores de pebolim. Então, escravizar prisioneiros de guerra é permitido em Lilliput?



 
Os bons momentos da fita devem-se basicamente ao carismático Jack Black que, com seu desempenho energético, tenta compensar (ou mascarar) os problemas do filme chamando a atenção para si, algo que funciona pontualmente, como na sequência onde Gulliver descobre uma ilha temida pelos liliputianos. O ator, que já conseguiu tirar leite de pedra em filmes como “A História Sem Fim 3″, faz o que pode aqui para manter o público entretido.

No entanto, bons atores como Billy Connely, Jason Segel e Emily Blunt parecem perdidos no filme. Blunt, aliás, deve ter demitido seu agente após essa empreitada, tendo em vista que fora obrigada a rejeitar o papel de Viúva Negra em “Homem de Ferro 2″ para trabalhar nesta produção. Isso, aliás, explicaria a falta de ânimo da atriz em suas cenas.



 
Os efeitos especiais são bastante artificiais, o que complica a interação de Black e dos atores que vivem os lilliputianos. A trilha sonora, a despeito de contar com músicas bacanas, não se encaixam bem no filme. Esse problema chega ao auge durante um forçadíssimo número musical no final do filme, com Gulliver interpretando uma constrangedora versão de “War”, que consegue ficar ainda pior nas cópias dubladas.

“As Viagens de Gulliver” não funciona como atualização do original e nem como veículo para seu ator principal, tendo em vista que este pouco pode fazer para brilhar com um roteiro tão precário. Jack Black pode ser um cara divertido, mas ninguém conseguiria sobreviver a este pepino de diminutas proporções.

 
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Thiago Siqueira é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.

 
Thiago Siqueira



 




 





 

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