domingo, 30 de janeiro de 2011

Um Lugar Qualquer - Contemple um lugar qualquer.



Ter o sobrenome Coppola não é uma tarefa fácil. Sofia não despontou como atriz, felizmente, e descobriu um talento incrível e sensível ao dirigir e roteirizar “As Virgens Suicidas” em 2000. Depois disso, com um ritmo de produção diferente de outros cineastas, lançou aos poucos seu olhar sobre a Sétima Arte com os ótimos “Encontros e Desencontros” e “Maria Antonieta”. Este último, alvo de muita crítica negativa por sua visão exagerada da personagem, a tornou alvo de chacota. Agora com “Um Lugar Qualquer” a cineasta retoma ao estilo que a consagrou, mesmo que tenha sido em um gueto bem fechado.



 

A trama é simples, bem como seus dois primeiros filmes. Stephen Dorff interpreta Johnny Marco, um ator de cinema bem sucedido e mulherengo assumido. Sua vida muda quando sua filha de 11 anos, interpretada pela belíssima Elle Fanning, passa uns dias com ele, alterando sua rotina e fazendo com que ele reveja o que tem feito da vida nos últimos tempos. A relação paternal desabrocha como o maior trunfo do longa, que pode sofrer um pouco com o nada-acontece de sempre, mas que no fundo tudo está em movimento e mudando constantemente.




 

Com a fama de trazer filmes cults às telonas, Sofia Coppola sai do glamour que investiu em “Maria Antonieta” e volta para a contemplação de cenas simples. Logo no início do filme, um carro percorre um mesmo caminho em círculos cinco vezes seguidas, enquanto a câmara tenta descobrir a causa disso. Logo conhecemos o protagonista, que pouco nos convence ser um badalado ator de Hollywood, até por não importar tanto. Em seguida, temos detalhes comuns de sua vida até que Cleo, sua filha, passa a viver com ele. Os dois parecem desfrutar de uma harmonia muito grande, afinal são pai e filha, mas há algo de estranho ali.




 

A diretora e roteirista ambienta a trama em um starsystem vazio e banal como catalisador de suas ações. Em uma coletiva de imprensa, Johnny não consegue responder nenhuma das perguntas dos jornalistas. É como se ele vivesse fora de um contexto e ainda não tivesse se encontrado como pessoa. No celular dele, chegam mensagens de texto que julgam sua índole, enquanto mulheres sedutoras aparecem a cada cinco minutos para levá-lo para a cama. Não há glamour em ser uma estrela. Esse universo se modifica quando sua paternidade entra em ação e uma nova rotina é exigida dele.




 

Aliás, Sofia Coppola é dessas de registrar rotinas e lugares comuns como ninguém. Não se admire em ficar exposto a situações banais por mais tempo do que qualquer outro diretor deixaria, nem mesmo se o personagem precisar refletir sobre a vida. O público é cúmplice de tudo que acontece ali e assiste passivo às situações criadas pelo roteiro. É como se a cada minuto os personagens fossem se modificando aos poucos, por mais que tais modificações nem sempre sejam visíveis.




 

Stephen Dorff dá o peso dramático ao papel balanceando com o cafajeste que é. Ele é o homem charmoso, viril e que todas querem. Elle Faning, agora crescida e com uma beleza estonteante, traz a sensibilidade e a empatia que fazem o espectador se apaixonar. Eles dois muitas vezes parecem dois amigos recém conhecidos, fazendo besteiras e sendo cúmplices das banalidades. Ninguém mais do elenco se sobressai, e nem deveria, já que o filme é da dupla. É deles que precisamos torcer para que se encontrem na vida. Mas na realidade, como bem sabemos, é mais fácil se desencontrar pelo caminho.



 

Na direção, Sofia é contemplativa, movendo suas câmeras de forma a revelar bem mais do que está em cena. Em determinado momento, após um belo banho de piscina de pai e filha, vemos os dois expostos ao sol, como se nada mais importasse na vida deles e o mundo tivesse parado. Para melhorar a cena, ouvimos I’ll Try Anything Once, cantada pelo The Strokes, ao fundo. A trilha sonora, aliás, é outro mérito, principalmente quando nos traz um pouco de Phoenix.




 
O final da trama traz um pouco de desconforto ao optar por uma saída fácil que desconstrói parte do protagonista, mas ainda assim é nessa escolha que a cineasta nos pega. Se há erros graves em “Um Lugar Qualquer” é a baixa tolerância que a indústria cinematográfica nos condicionou a ter. Queremos tudo rápido e fácil, sem gerar nenhum tipo de discurso após o final da projeção. Sofia Coppola nunca prometeu isso de seu cinema e continua uma cineasta maravilhada pelo ser humano, pelo vazio e pelo simples olhar. Apenas contemple.



 
Diego Benevides
twitter.com/DiegoBenevides


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