sábado, 27 de novembro de 2010

Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos - crítica 2



O diretor e roteirista Woody Allen se caracterizou por um determinado período da sua carreira em criar tipos nova-iorquinos que também funcionavam como alter-egos dele mesmo. Durante o tempo que filmou em Nova York, Allen trouxe à tona a sua versatilidade de conseguir envolver o espectador com personagens de conflitos interiores e outros que se mostravam irônicos com o que acontecia na vida. Com as dificuldades financeiras de ter que filmar na cidade que ama, Allen passou a rodar os seus filmes em Londres e, tão cinzenta quanto a própria cidade, as suas obras passaram a conter histórias com doses homeopáticas de pessimismo que se juntavam com a solidão e a infelicidade de viverem as suas vidas.



“Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos”, o mais novo trabalho de Woody Allen, apresenta Helena, uma idosa que se separou do marido, Alfie, depois de quase 20 anos juntos. Para superar a dor da perda, ela se consulta com a médium farsante Cristal, mulher na qual ela confia a sua vida e, claro, o seu dinheiro. Isso, no entanto, é uma forma da filha deles, Sally, manter a mãe nos trilhos mesmo sabendo que Cristal é uma mulher falsa que está apenas tirando dinheiro dela. Sally é casada com Roy, um escritor que conseguiu escrever apenas um livro e, agora, luta para emplacar mais um romance uma vez que os dois não podem sobreviver apenas com a ajuda da mãe de Sally, ou do trabalho dela na galeria de Greg, um homem galanteador e que tem pouca importância na trama.



Estas histórias que são entrelaçadas pelo roteiro escrito por Woody Allen colocam os personagens à beira de um ataque de nervos, em que eles podem explodir a qualquer momento. O pai de Sally, por exemplo, conhece uma mulher mais nova em um desses encontros que são arranjados. Sem pensar duas vezes, e também sofrendo a solidão de ter se separado, ele a pede em casamento mas, para conseguir seguir com o ritmo da sua atual esposa, ele se enche de Viagra para tentar provar que ainda está com a saúde de uma criança quando, na realidade, ele já não tem mais essa força. Enquanto isso, o casamento entre Roy e Sally é recheado de dilemas já que, ao mesmo tempo em que ela deseja ter uma criança, Roy deixa claro que esta não é a sua vontade no momento. Quando Roy conhece a sua vizinha, Dia), ele se apaixona e deixa de lado o seu relacionamento com Sally, que também se vê apaixonada por Greg (apesar de não ser correspondida).



Neste emaranhado de histórias, Woody Allen retoma aqueles assuntos que são vistos na sua fase londrina. Tudo começa com “Match Point”, quando um professor de tênis está prestes a se casar com a filha de uma poderosa família. Mas, na realidade, ele se apaixona pela outra e ambos tentam dar um golpe para ficarem com o dinheiro. O pessimismo do diretor americano neste filme está naquele final melancólico, em que o personagem do ator Jonathan Rys-Meyers está parado e sozinho com uma moeda na mão, à beira de um rio. Em seguida ele filmou “Scoop – O Grande Furo”, um filme em que Allen apela mais para o lado cômico, mas sem deixar de mencionar a morte, a melancolia, a tristeza e a solidão. “O Sonho de Cassandra”, feito logo em seguida, possui semelhanças mais precisas com a ideologia que Woody Allen planta nos seus filmes londrinos: personagens em busca de dinheiro, infelizes, vivendo sozinhos, com destinos trágicos, histórias que são sempre contadas com um pessimismo característico e fotografia acinzentada que reflete, não apenas a cidade, mas o próprio momento obscuro que está presente em seus filmes.



Neste novo filme, o cineasta segue como se fosse uma crônica contemporânea recheada de casais que tentam viver entre eles mesmos, lidando com os problemas de cada um e, principalmente, as suas respectivas diferenças. Em relação a isso, Allen me parece um diretor também preocupado com a encenação dos seus filmes. E isso começou a acontecer com “O Sonho de Cassandra”, em que a montagem da obra segue uma linha narrativa interessante até o seu desfecho. Se antes ele se preocupava apenas com a ação das tramas, com os travellings que tinham o intuito de captar os aspectos gestuais das suas personagens e as suas mudanças de personalidade naquela cena, Allen agora também se mostra um cineasta preocupado em conseguir entrelaçar as histórias que conta, juntando as personagens por meio de um fio condutor que, normalmente, vem sendo expressado pelo abstrato, por sentimentos como o amor, a dor, a perda, a solidão e a felicidade.



De qualquer forma, eu me preocupo até que ponto estes filmes ainda conseguem ter relevância. No caso de “O Sonho de Cassandra” e “Match Point”, o diálogo entre os dois envolvendo a busca das suas personagens pela ascensão social na conquista do poder e do dinheiro é bastante clara. Tais filmes se apresentam claramente como uma obra que é construída a partir de relações (paternais e familiares, de uma maneira) que são o ponto de partida para se compreender a história. Neste intervalo de tempo, Woody Allen ainda filmou “Tudo Pode Dar Certo”, que é extremamente pessoal e eficaz em sua proposta. No caso de “Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos”, Allen se apresenta como um cineasta repetitivo nas abordagens que ele possui em relação às tramas que ele constrói. O diretor cria uma expectativa no início do filme de envolver estas histórias e personagens com as relações complexas que são características da sua filmografia, mas os pontos de virada do seu roteiro não se mostram eficazes e o filme ainda termina de uma maneira vaga e sem sentido.



Mais uma vez, as questões humanas e as amarguras são colocadas em jogo neste seu novo trabalho. Mas até que ponto o tratamento que o diretor dá para estes temas ainda são relevantes ou interessantes de serem acompanhados? Mesmo que seja possível duvidar da inteligência de Woody Allen em se reinventar como diretor, não dá para desmerecer o trabalho que ele tem de conseguir unir estas histórias que se fundem com o tormento das suas personagens em viverem com medo do futuro, de não saberem se vão ainda ser felizes e de seguirem um modo de vida melancólico e desequilibrado – no sentido de ficarem em dúvida sobre aquilo que eles querem. Woody Allen não consegue realizar um filme eficaz mas, ainda assim, ele possui a capacidade de filmar histórias que relatam a questão humana como poucos atualmente.

NOTA:

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