sábado, 21 de novembro de 2009

Há Tanto Tempo Que Te Amo


Em alguns momentos da vida, somos forçados a tomar decisões, que de tão duras e inevitáveis, nos levam por caminhos pelos quais não estamos preparados.


Esse é o caso de Juliett Fontaine (Kristin Scott Thomas), que acaba de sair da prisão após 15 dolorosos anos. Foi lá que a protagonista de “Há tanto tempo que te amo” construiu para si um muro onde escondia os problemas acarretados com a morte de seu único filho, em circunstâncias desconhecidas, faz crescer uma aura de mistério em torno da sua figura.

Suas primeiras horas de liberdade são marcadas pela ansiedade e pela espera. A partir de então, Juliette passa a viver com a irmã mais nova, Léa (Elsa Zylberstein), seu esposo, as duas filhas adotivas do casal e o sogro.


Aos poucos começa a lidar com sua nova condição, mas a adaptação não é fácil, principalmente porque existe mágoa e ressentimento, não apenas entre as irmãs, mas de Juliette consigo mesma. Contar uma história em pequenas doses, deixa o espectador atento e curioso, ferramentas que Claudel conhece muito bem. Assim, Juliette e sua afeição à solidão, são mostradas “time by time”. Os motivos que levaram Juliett a cometer um ato tão condenável são diluídos “take a take”, em doses homeopáticas, expressão por expressão, mas também muito é dito quando nada é dito.

Mesmo com tantas restrições, Juliette consegue chamar a atenção do professor universitário Michel (Laurent Grévil), um homem com seus próprios demônios e um passado também obscuro. É ele quem consegue demolir a amargura, a frustração e os medos de Juliette, sempre de forma com muito tato. O mesmo não se dá com o Capitaine Fauré (Frédéric Pierrot), um homem desiludido, que busca em Juliette um fio de esperança para sua própria existência, o que acaba em um desfecho inesperado.

Kristin Scott Thomas despe sua personagem de beleza, maquiagem e vaidade. Tudo isso vai para segundo plano. Até mesmo as expressões e a forma de falar ajudar a construir uma Juliette a partir de silêncios e olhares. A personagem procura de forma gradual e muito cuidadosa, estabelecer novos horizontes em uma realidade desconfortável para si, e para o espectador. A atriz tem aqui uma das melhores atuações da sua carreira, indo mesmo além de outras fantásticas interpretações, também em obras igualmente soberbas.

Claudel é um escritor experiente, e as pequenas deficiências de seu début à frente das câmeras são esquecidas quando percebe-se a sutileza e sensibilidade com as quais constrói o drama. Talvez por isso o roteiro seja impregnado de frases que privilegiam os sentimentos e de nuances psicológicas bem desenvolvidas, expostas com extrema sensibilidade por um grande elenco. Para um iniciante, o romancista fez um trabalho soberbo, tanto em técnica quanto em produção, utilizando sabiamente a câmera para compor situações e sensações, auxiliada por uma fotografia, luminosa, que coloca sempre em destaque as expressões, além de manejar uma trilha sonora que vai além de compor estações.

O trunfo de “Há tanto tempo que te amo” é lidar com os sentimentos comuns a todas as pessoas. Claudel pincela emoções em suas linhas e dá um contorno especial às expressões de seus personagens, principalmente quando confronta, com extrema habilidade, opiniões e verdades absolutas. É possível, em muitos momentos entender e compartilhar das mesmas fraquezas e inseguranças de Juliette e Léa, a partir do olhar sobre o isolamento familiar, da negação social e do preconceito, do que pela compreensão do próprio crime em si.

Discutir o passado, a partir das conseqüências de um só para com a coletividade, é um ponto de partida para Claudel fazer o que faz melhor em seus livros, dissecar a alma das pessoas, suas razões e suas incertezas diante do mundo. A forma como as pessoas reagem ao saber que a protagonista cometeu um crime é deveras dualística. Ora se apresentam com aceitação, ora com rejeição e desconfiança. Crível ou não?

Pode-se dizer que esta é uma história de gente comum. A morte, a vida, o amor, a impotência, a coragem, a covardia… São sentimentos presentes em todo ser humano, e às vezes, é preciso dizer, como o autor bem o faz, que tragédias não respeitam classe social, que os dilemas não devem ser postos de lado, que as perguntas não devem ser ignoradas, que a vida não pára por que a gente não a acompanha.

Como confirma a própria Juliette, a vida segue. Com ou sem a gente. Por isso, quando o filme termina, a gente fica um pouco desorientado, apático. Talvez porque as revelações do filme não são sobre personagens críveis, mas sobre nós mesmos.

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Debora Melo

cinemacomrapadura.com.br

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