Avaliação: NOTA 4
 
 

O casal Riccelli adora trabalhar junto. Pelo menos no cinema, eles são atualmente inseparáveis. Se Carlos Alberto dirige e produz, a esposa Bruna Lombardi atua, escreve o roteiro e também produz. Os resultados das colaborações familiares, porém, não têm sido dos mais empolgantes. Tendo se iniciado timidamente em 2005, com o desconhecido “Stress, Orgasmos e Salvação”, a parceria ganhou mais repercussão com o fraco “O Signo da Cidade” (2007) e continua agora na mesma balada decepcionante, mesmo mudando bruscamente de gênero. Saindo do drama e caindo na comédia, os Riccelli fazem de “Onde Está a Felicidade?” um filme em busca de todas as situações cômicas possíveis, não importando se elas trazem a resposta à pergunta de seu título ou não.

Na verdade, o longa está mais para algo como “Onde Está a Próxima Gargalhada?”. E a maioria delas se encontra na Europa, onde grande parte da história se passa. Lá Téo ou Teodora (Lombardi), como preferir, ao lado do chefe e da sobrinha de sua maquiadora, protagoniza uma série de piadas que em nada ajudam em seu processo de autoconhecimento, que deveria ser o motivo para a viagem da paulistana. Logo, torna-se normal vê-la se atracar com o atendente do hotel apenas para provocar o marido, beber exageradamente em todas as ocasiões possíveis e brigar de forma intensa com tudo e todos, apenas para depois voltar a fazer as pazes e dar continuidade a sua “caminhada” interminável e embaraçosa.

As andanças teriam uma razão de existir. Ela acaba de flagrar uma traição virtual de Nando (Bruno Garcia), companheiro de matrimônio há 11 anos, e não admite ser colocada em segundo plano. Começa, então, uma crise existencial que também a prejudica na apresentação de seu programa de culinária. Mas o futuro profissional de Téo já estava decidido: a rede de televisão foi comprada por uma igreja evangélica e logo toda a programação será modificada. Tentando resolver seus problemas como mulher traída e chef de cozinha sem emprego, ela, então, decide ir até a Espanha e percorrer o caminho de Santiago de Compostela, aonde, teoricamente, encontraria a paz espiritual.

No entanto, é em São Paulo que o filme tem seus melhores momentos, graças a uma grande referência que se estende mais do deveria (para a felicidade do público). O diretor Carlos Alberto Riccelli, sua direção de arte e o roteiro de Bruna Lombardi homenageiam o maior diretor do país em que desembarcarão minutos depois com cenários de cores fortes, diálogos bem construídos e situações melodramáticas. O mundo de Pedro Almodóvar invade o Brasil de Riccelli. Estaria faltando apenas o sotaque acentuado, o que logo é sanado com a presença preciosa de Maria Pujalte, atriz espanhola que faz às vezes de maquiadora tagarela que adora dar conselhos  e distribuir pílulas mágicas. A referência casa com o corrente alto nível de stress da trama, desaguando em risadas que infelizmente não se repetem com a mesma intensidade daí em diante.

Desde o momento em que deixa sua terra natal, a protagonista começa sua busca atrás de confusão, que, no máximo, a ajuda a perceber o quanto ela é mimada e dondoca, dependente de cremes e chapinha, mesmo para percorrer mais de 900 quilômetros de estrada. O pior é que ela jamais procura consertar sua mania de consumismo, muitos menos diversos outros defeitos que são os motivos óbvios de sua atual tristeza. Sem permitir que Téo se questione ou reflita sobre sua atual situação, o roteiro aposta em saídas extremamente comerciais que preferem personagens caricaturais a pessoas de emoções verdadeiras.

Riccelli até tenta incluir sequências apreciativas, que valorizam o maravilhoso cenário da caminhada. Mas o faz de maneira tão tímida, que só resta lamentar. Mesmo assim, a forma brusca em que o cineasta transita entre o escasso drama e a dominante comédia desvaloriza ainda mais as citadas cenas. Logo, os espectadores são obrigados a lidar com a recorrente chatice de Zeca (Marcelo Airoldi), o diretor do programa que quer fazer um novo show, que não se cansa em mandar e desmandar nos outros, bem como desrespeitar brasileiros e espanhóis. A história faz também questão de conceder-lhe um envolvimento amoroso, que pelo menos nunca se leva a sério.

O mesmo não se pode dizer da relação entre Téo e o marido. Forçando a barra para que o desentendimento entre os dois permaneça até o desfecho, o roteiro não hesita em colocar adolescentes, camareiros e um porco no meio do caminho da união do casal, resolvendo tudo da forma mais brega, artificial e clichê possível. A situação seria menos desagradável se essa enrolação amorosa que resulta em uma caminhada percorrida quase que inteiramente de carro não tivesse duas horas de duração. Cortar as partes cedidas para Nando lamentar e discutir com os colegas de profissão as besteiras que fez seria o começa para deixar “Onde Está a Felicidade?” um longa enxuto, mas que, ainda assim, não deixaria de ser medíocre.
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Darlano Dídimo é crítico do CCR desde 2009. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é adorador da arte cinematográfica desde a infância, mas só mais tarde veio a entender a grandiosidade que é o cinema