terça-feira, 4 de agosto de 2009

Na era do MP3, disco de vinil recupera espaço entre os fãs de música



Artistas da nova cena como Mamelo Sound System e Mauricio Takara lançam LPs.
Festa em São Paulo proporciona diversão gratuita ao som de antigos bolachões.

Ele resistiu à praticidade da fita cassete e ao brilho reluzente do CD. Agora, o disco de vinil dá pistas de estar vencendo mais uma batalha, desta vez com o MP3. Nem o fechamento, no início deste ano, da última fábrica de LPs do Brasil, a Polysom, que ficava em Belford Roxo, no Rio de Janeiro, está impedindo que o formato ocupe seu merecido espaço no mercado especializado por aqui.

Enquanto os Estados Unidos dão continuidade à cultura de oferecer quase todos os seus lançamentos também em vinil – no ano passado, o país vendeu 1 milhão de unidades, e a previsão para 2008 é de 1,6 milhão - artistas da nova cena paulistana recorrem a fábricas estrangeiras e apostam na clássica bolacha como forma de propagar o seu som.

“Pra começo de conversa, o vinil alcança um espectro de frequências sonoras maior do que qualquer outra mídia, especialmente no campo de grave”, defende Rodrigo Brandão, MC do Mamelo Sound System. “Fora o aspecto técnico, tem o lado estético: nada se compara às capas de vinil. O status de obra de arte que um álbum atinge nesse formato é único.”

“No caso do Mamelo, a importância é ainda maior, já que o vinil teve papel vital no nascimento - e ao longo da história - do hip hop, que é o nosso estilo musical”, diz o rapper, que divide um LP com o grupo Elo da Corrente, prensado pela Polysom e lançado em 2007 pela Boomshot.

Agora, a mais nova empreitada do selo pilotado pelo produtor Zeca MCA é o lançamento em vinil do primeiro disco solo de Lurdez da Luz, MC parceira de Brandão. MCA conta que entrou em contato com uma fábrica de discos de vinil em Paris por conta de um amigo DJ. Da capital francesa vão sair 200 unidades do álbum, ainda sem título, a ser lançado até o final do ano.



“Não dá para competir com os downloads de MP3”, diz MCA. “Estou apostando na Lurdez primeiro porque não existe disco solo de rap feminino no Brasil. E, depois, porque ela é uma MC diferente, que não tem essa pegada de mano que geralmente as meninas do rap têm. Estou percebendo um interesse maior do público em geral em comprar LPs.”



Os números podem não ser tão altos, mas falam por si só. O EP “Ocupado como gado com nada pra fazer”, quarto trabalho do multi-instrumentista Mauricio Takara – conhecido pela participação em grupos como Hurtmold, Instituto e São Paulo Underground – acaba de ser lançado em CD e vinil pelo selo paulistano Desmonta. No primeiro show de divulgação, foram vendidos 80 exemplares do LP a R$ 15 cada um.




Meu Brasil brasileiro

Mas se depender da Deckdisc, que inclui em seu catálogo uma vasta gama de artistas, de Pitty a Nação Zumbi, passando por Teresa Cristina e Ratos de Porão, o terreno dos discos de vinil pode se tornar ainda mais fértil. A gravadora está planejando a instalação de uma fábrica no Brasil, mas o projeto ainda está em fase de pesquisa. Pode ser que a empresa compre equipamentos da antiga Polysom, ou então que adquira maquinário mais moderno no exterior.

A Deck já lançou dois LPs do DJ Marcelinho da Lua, um do rapper Black Alien e um compacto do produtor de dub Mad Professor. Recentemente, a gravadora editou também um single da Pitty, que foi distribuído para a imprensa na ocasião do lançamento do álbum “Anacrônico”.

A situação pode ser complicada, mas quem coleciona vinil no Brasil sabe a delícia que é sair à caça de suas bolachas prediletas. Além dos sebos especializados espalhados pela cidade (principalmente nas galerias do Centro) e ainda nas feiras de antigüidades como a Benedito Calixto, em Pinheiros, e a do Bixiga, na Bela Vista, os interessados em comprar LPs encontram boas opções - novinhas em folha - em redes como a Livraria Cultura.

A loja do Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, oferece apenas uma prateleira de LPs em meio a um mar de CDs e DVDs, mas já é um bom começo. Ali, é possível encontrar os principais lançamentos gringos, como os últimos de Amy Winehouse e Cat Power, além de Radiohead, Foo Fighters e Beck. O preço ainda é salgado - a partir de R$ 70 por um álbum simples - mas a alegria de poder ouvir tudo em alta qualidade (e em grande estilo) vale a pena.



Com um caprichado set que vai de Ray Conniff a Ray Charles, passando por Glen Miller, Frank Sinatra e outros clássicos, Seu Osvaldo Pereira, 74 anos, foi um dos responsáveis por animar uma edição recente da festa Vinil é Cultura, que acontece todas as terças com entrada gratuita no Centro de São Paulo.

“As músicas deles não podem faltar em um bom baile”, diz o primeiro DJ do Brasil que, é claro, só trabalha com bolachões. “Quando o CD passa do volume, o som fica distorcido. Em todos esses anos, aprendi algumas coisas. Uma delas é ficar longe da bebida. Outra é a alta fidelidade do vinil”, brinca o técnico em rádio que começou a carreira em 1958.

Criada há oito anos, a balada nasceu do encontro de lojistas e colecinadores de LPs. “Vi uma reunião no Rio de Janeiro e passei a fazer igual aqui”, conta o DJ Lula, que é dono de uma loja de discos na Avenida São João.



“Tudo começou com cinco amigos. Hoje, recebemos os melhores DJs de fora e daqui.” Entre eles, os filhos de Seu Osvaldo, que levam adiante os ensinamentos do criador da Orquestra Invisível.

A festa Vinil é Cultura já passou por diversos endereços, e atualmente acontece em um dos salões do Hotel Cambridge, na Rua Álvaro de Carvalho. A noite por lá começa cedo, a partir das 19h, e costuma terminar às 23h. O telefone para informações é (11) 3104-9397 ou 3101-2537.



Lígia Nogueira
Do G1, em São Paulo

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