sexta-feira, 27 de maio de 2011

The Mentalist – 3×23:

Strawberries and Cream

[Season Finale]


(…)

Spoilers Abaixo:

Ousadia é uma característica muito rara, principalmente nos dias de hoje. É muito difícil ver alguém saindo de sua zona de conforto para criar algo inédito, que modifique o conceito das coisas. Na televisão isso se verifica de maneira incrivelmente fácil, uma vez que cada vez mais vemos shows que, temerosos por espantar a audiência, prendem-se a uma fórmula básica, muitas vezes sacrificando a qualidade. The Mentalist passou toda a sua terceira temporada alternando momentos em que buscava algo diferente com outros em que mostrava ter medo de ousar. Isso até este Strawberries and Cream, em que a série finalmente demonstra todo o seu potencial, modificando de maneira incrível o rumo dela.

O episódio começa com Alan Dinkler, armado com uma bomba em seu corpo, entrando em um posto de gasolina, à procura de alguma coisa. Abordado pela polícia, sua bomba é acionada, explodindo-o, mas apenas ferindo uma garota, sem vítimas. A CBI é então chamada para investigar o crime, tentando encontrar motivações para o rapaz, de boa índole, cometer tal atrocidade. Ele havia roubado, minutos antes, uma empresa de transações financeiras, chamada Ca$h in Motion. Após muitas investigações, descobre-se que Dinkler era apenas um fantoche, e o verdadeiro responsável pelo crime é Anthony Gupta. Em seguida, Jane e Lisbon descobrem que o Gupta também não era o grande líder, ao ficar evidente o envolvimento de Red John na situação. Com isso, os dois resolvem finalmente investigar quem é o amigo do serial killer dentro da agência.
Strawberries and Cream divide-se em duas partes muito bem definidas pelo próprio roteiro. Aliás, é importante ressaltar a eficiência com que o roteiro conduz sua história, fazendo com que a 1h20 de tela não soem em momento algum cansativas para o espectador. Pelo contrário, o episódio passa ao público a sensação de ser muito mais rápido que muitos outros dentro desta mesma temporada. Além disso, cada minuto tem sua importância evidenciada, mostrando que é possível construir um roteiro sem nenhum tipo de enrolação, mantendo todos ligados na história e nos diálogos, diretos e objetivos.

A primeira parte do episódio é o caso da semana, que pela primeira vez em muito tempo não envolve um assassinato, e sim um falso ataque terrorista. É impressionante a forma que o roteiro encontra para desenvolver a investigação, de maneira coerente e harmoniosa, sem precisar forçar alguma evidência. A primeira cena, com um desesperado Dinkler sabendo estar próximo da morte, é perturbadora, graças à competente edição de som, que consegue criar o clima de tensão de maneira eficiente. Depois, o roteiro cuida de desenvolver sua história de maneira sempre cuidadosa. Repare como a cena dentro da Ca$h in Motion tem como única finalidade humanizar Dinkler, de forma a descartá-lo rapidamente como responsável pelo crime. Os roteiristas têm esse cuidado justamente para garantir coerência à investigação, mesmo que o espectador já soubesse que haveria outro responsável. E o desfecho do caso não poderia ser melhor trabalhado, com uma inteligentíssima condução dos fatos, explicados de maneira detalhada instantes após a captura de Gupta. As habilidades de Jane dessa vez não parecem de forma alguma com meras adivinhações, baseando-se em observações realmente pertinentes. Aliás, a coerência é o que reina nesse momento do episódio, uma vez que o roteiro estrutura-se procurando esse momento de genialidade de Jane. Repare como o consultor já desconfiava de algo no instante que se dirigia ao colégio abandonado.  Ao conversar com o criminoso, essa desconfiança tornou-se certeza.

Ao encerrar a investigação, a parte final do episódio se inicia. Mesmo que o espectador não tenha visto nenhum promo ou sinopse desse season finale, era evidente que esse se trataria de Red John em algum momento. Mas o roteiro acerta ao ignorar essa certa previsibilidade ao nos conduzir ao serial killer de maneira calma e direta. Aí, inicia-se o que há de melhor em Strawberries and Cream. Os roteiristas são muito felizes ao finalmente mostrar a lista de suspeitos de LaRoche, e ao incluir nessa apenas personagens que já tenham aparecido em algum momento, mesmo que por pouco tempo. E, nesse ponto, o roteiro consegue interagir com o espectador de maneira absolutamente perfeita. Exceção feita à Osvaldo Ardiles, todos os suspeitos agem de forma incrivelmente estranha em algum momento. LaRoche atira em Gupta, enquanto Brenda Shettrick mostra-se muito desconfiada do “engano” de Lisbon. Já Bertram parece estranhamente acuado. Finalmente, O’Loughlin fica demasiadamente interessado nas atividades de Van Pelt.

O agente do FBI, aliás, é o verdadeiro amigo de Red John. A maioria das pessoas que acompanham a série sabiam que havia algo errado com ele, o que tornaria a solução do roteiro previsível. Tornaria, porque o roteiro encontra uma solução brilhante para contornar sua própria previsibilidade, aproveitando para criar uma atmosfera tensa e de expectativa. Isso começa com a já citada atividade suspeita dos outros membros da lista de LaRoche, passando pelo inteligente plano de Jane, e culmina exatamente no momento em que a equipe imagina que Bertram é o traidor. Dessa maneira, os roteiristas causam um certo choque no espectador, certo da culpa de O’Loughlin. Depois, o episódio conta com a ingenuidade de Van Pelt para construir muitíssimo bem a reviravolta. É verdade que no momento que O’Loughlin se interessa por ir com a noiva para cuidar de Hightower cria-se a desconfiança de que todos estavam certos, mas mesmo essa ideia é executada de maneira eficiente, já que em seguida Jane descobre exatamente a mesma coisa, em uma epifania a la House do consultor. Assim, o que poderia ser óbvio torna-se uma excelente construção de roteiro, que prende a atenção do espectador do início ao fim.

Encerrada a discussão sobre O’Loughlin, chegamos ao momento mais importante do episódio e, por consequência, da temporada. Mas antes de entrar em detalhes, é necessário comentar sobre a figura de Patrick Jane. Sempre afirmei que a construção do personagem é feita de maneira profunda e tridimensional, e aqui ele dá mostras de todas as motivações que o compõem. No começo do episódio, Jane mostra-se pouco interessado pelo caso, fato que vinha acontecendo desde Red Queen. No decorrer da investigação, no entanto, o consultor parece notar que há algo fora de ordem ali. Isso acontece quando decide ir atrás de Lisbon no colégio abandonado, e lá, ao ver a amiga com uma bomba no corpo, a expressão facial dele passa de indiferente para preocupação. Em seguida, ao perceber o envolvimento de Red John na situação, seu interesse muda por completo, e Jane parece infinitamente mais animado e excitado que nos minutos iniciais do episódio. Até o momento em que vê o celular de um homem sentado próximo a ele tocar. É nessa hora que sua excitação se transforma em uma mistura de perplexidade e obstinação.

O que nos leva à cena final de Strawberries and Cream. Dentro de um shopping, um ambiente muito mais agitado que o esperado, acontece o encontro entre Patrick Jane e Red John. Vestido como um homem elegante e simples, mas mostrando em seus óculos sua preferência pela cor vermelha, o serial killer mostra logo de cara que não pretende se esconder. Fala diante de um incrédulo Jane que é uma pessoa normal, e não o monstro que o inimigo imaginara. Até aí, a conversa segue como o jogo de gato e rato iniciado no episódio piloto da série. Mas Jane quer saber se ele é realmente a pessoa pela qual procura há tantos anos. E, nesse momento, The Mentalist consegue mostrar o que de mais genial criou desde sua estreia. Ao ver Red John referir-se ao cheiro de sua esposa e filha de maneira tão serena e ausente de culpa alguma, Jane (no melhor momento de Simon Baker em toda a série) muda completamente sua expressão, inundado por uma tristeza insuportável. E, em um tom choroso, apresenta a sua última jogada, exatamente da forma que Jane desejava. Sem a presença de Lisbon ou nenhum conhecido, mas sozinho frente ao motivo de sua maior agonia. Aí, como quem acaba de tirar o peso do mundo de suas costas, senta-se e continua a beber seu café, exatamente a mesma reação que teve ao matar o Dr. Steiner, em The Red Mile. E, mesmo ciente que policiais logo o prenderiam, ele se mostra calmo e feliz como nunca. Nesse momento, a câmera se afasta, exibindo o corpo estirado de Red John ao chão, coberto da cor que tanto admira. É, sem dúvidas, o momento mais incrível da série, carregado de uma sutileza e sensibilidade impressionantes, criando uma cena poética e surpreendente.

Um final que coroa um season finale perfeito, criado em um ritmo corretíssimo e brilhante. Sem dúvida alguma o melhor episódio da série. O que podemos esperar de The Mentalist após essa mudança definitiva de rumo, nem mesmo os roteiristas sabem. Só sabemos, ao ver Strawberries and Cream, que dificilmente as coisas voltarão a ser como antes.

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