sábado, 19 de março de 2011

MahaBharata: "O modo de vida, a busca da iluminação, a ilusão dos sentidos, a presença dos deuses entre os humanos, a crença no karma e no dharma"


O Mahabharata é talvez o maior épico já escrito. Seu original chega a cem mil versos em sânscrito. Nele está contido famoso diálogo entre Krishna e Arjuna que se destabou como uma obra em separado, chamada Bhagavad-Gita.

Uma das maiores narrativas já concebidas pelo homem, o Mahabharata conta sob o ponto de vista do hinduísmo uma história poética da humanidade, desde sua origem até a grande guerra que por fim a definiu.

Quinze vezes maior do que a Bíblia, o Mahabharata é um épico composto de dezenas de histórias e centenas de personagens, supostamente escrito há 3 mil anos pelo poeta Vyasa, e anotado pela divindade Ganesha. A questão da origem do texto, como se pode imaginar, é mais do que confusa, e não há consenso de que ele foi todo escrito na mesma época e pela mesma pessoa, nem se foi anotado pelo mesmo elefante. É possível depreender do texto acontecimentos históricos da Índia, como grandes batalhas, genealogias de famílias reais, a origem das castas, de cidades e tanto mais. Além disso, as histórias contadas no Mahabharata têm aventura, drama, comédia, lances inusitados, traições. Não é de se estranhar que a primeira adaptação para o cinema, segundo o Imdb, tenha sido rodada já em 1920, sem som. 
 


A versão escolhida para lhes apresentar o MahaBharata, é a que foi dirigida para a televisão francesa por Peter Brook. Com texto de Jean-Claude Carrière (renomado roteirista de, entre outros, A bela da tarde, A insustentável leveza do ser, Brincando nos campos do senhor e do recente Os fantasmas de Goya), o Mahabharata de Brook chegou a ser exibido no cinema, ainda que em um corte bem menor do que o da televisão. É possível encontrar essa versão reduzida em VHS, embora a série integral, de cinco horas e meia de duração, só exista em um DVD inédito por aqui. Pode parecer longa, mas nem de perto dá conta de todas as tramas e subtramas do texto original. Para se ter idéia, o seriado indiano do Mahabharata (1988-90), que pretendia contar a história toda, tem mais de setenta horas de duração.


Peter Brook e Jean-Claude Carrière adaptaram o Mahabharata primeiro para o teatro. A peça, que tinha cerca de nove horas de duração, era falada em francês e depois foi traduzida pelo próprio Carrièrre para o inglês. Deste texto, os dois criaram a minissérie que estreou na televisão francesa e na BBC em 1989.


O Mahabharata narra a guerra entre duas famílias de semideuses, os Kaurava e os Pandava, pelo controle de um reino ancestral. É também um relato minucioso de todos os pequenos e grandes eventos que, ao longo de séculos, culminaram nessa guerra. São dezenas de mitos da mais variada espécie, que vão se entrelaçando aos poucos para mostrar de onde surgiram as duas famílias, na verdade dois ramos de uma mesma família, e como eles se tornaram rivais.
O rei no momento é o cego Dhritarashtra, patriarca dos Kaurava. Seu irmão, Pandu, morreu vítima de uma maldição terrível, que não o permitia tocar, quanto mais agarrar, como ele tentou, as mulheres.

A linhagem de Pandu, os Pandava, ficou sob o cuidado de Dhritarashtra e sua prole, mas desde o início os primos todos não se deram bem. Porém, mesmo relegados pelo tio a uma região infecta do reino, os Pandava prosperaram, o que despertou inveja e outros sentimentos mesquinhos nos primos monarcas. Sabendo que Yudhishthira, líder dos Pandava, é apaixonado pelos dados, e que ele joga mal, os Kaurava armam uma partida. Rodada após rodada, Yudhishthira perde suas jóias, seus castelos, os exércitos, as jóias e os castelos dos irmãos.
Ele então perde o reino, a si mesmo e a esposa, Draupadi.


Mas há um problema, e, portanto, uma breve lenda para explicá-lo. Quem ganhou Draupadi numa competição foi Arjuna, irmão mais novo de Yudhishthira. Ele teria o direito de casamento, se não tivesse chegado em casa e dito: "Olha só o que eu trouxe, mãe!". Isso porque a mãe, antes de olhar o que se tratava, respondeu: "Seja o que for, divida com seus irmãos". E ela nunca pode voltar atrás no que fala, o que é uma espécie de costume dos semideuses hindus mais ortodoxos. Então Draupadi se torna esposa dos cinco Pandava, e não só de Yudhishthira. E além do mais, ela foi apostada depois de ele ter perdido a si mesmo no jogo de dados, o que suscita todo o tipo de questão quanto à legitimidade da aposta. Novos arranjos são discutidos e os Pandava acabam no exílio. Eles devem permanecer 13 anos na floresta, o último deles sem serem encontrados pelos Kaurava de maneira alguma, sob pena de morte. Depois do período, eles poderiam voltar à capital reclamar o trono.


A batalha:
Os irmãos Pandava não acreditam nas promessas de Dhritarashtra, e passam os próximos 13 anos conquistando aliados e se preparando para a guerra. A batalha entre as famílias é o ponto central da narrativa, e ocupa as duas horas finais da fita.
De um lado, os Kaurava contam com Bishma e Drona.
O primeiro é tio de Dhritarashtra, um guerreiro mitológico que recebeu dos deuses o direito de escolher a hora de sua morte. As duas famílias cresceram na companhia de Bishma, que bem preferia lutar ao lado dos Pandava, mas uma combinação de maldições e promessas faz com que ele seja obrigado a liderar os Kaurava no campo de batalha. Drona é outro grande guerreiro, na verdade quem treinou todos os primos para guerra, e ele é leal ao rei.


Do lado dos Pandava está Krishna, a encarnação do deus Vishnu na Terra. Krishna é uma espécie de conselheiro das duas famílias, mas antes da batalha ele oferece a Arjuna uma escolha. Arjuna e os Pandava podem contar com todos os exércitos de Krishna, que não são poucos, mas para isso teriam de abdicar de seus conselhos para os Kaurava. Ou, se preferissem, poderiam ter os conselhos de Krishna, mas o exército ficaria com os rivais. Arjuna escolhe a companhia de Krishna, e os dois sentam-se no campo de batalha, pouco antes de o conflito começar.
Essa conversa entre Arjuna e Krishna constitui o Bagavhat-Gita, livro sagrado do hinduísmo. Krishna então conduz a carruagem de Arjuna para as fileiras inimigas, e a guerra começa. Nos dezoito dias seguintes, enquanto milhões de soldados se digladiam, as tramas paralelas vão se fechando e os personagens acertam as contas e cumprem as dezenas de vinganças e maldições que trocaram nas décadas anteriores.


Para Peter Brook, o Mahabharata é uma história universal, que fala a todas as culturas, e por isso, assim como na peça, o elenco é internacional são italianos, franceses, ingleses, egípcios, senegaleses, etc. Embora não seja exatamente uma versão filmada da peça, a fita empresta do teatro o andamento, os cenários simples e a ênfase colocada toda nos atores e no texto. O filme traz para o ocidente uma amostra bem traduzida e bem contada do que são essas grandes narrativas de fora da nossa tradição literária, sobre as quais mal ouvimos falar. E, se às vezes você se sente um indiano assistindo a Os dez mandamentos, tentando entender quem é quem e o que está acontecendo, no geral a história não é totalmente distante da cultura ocidental, e tem a peculiaridade de contar ainda com inúmeras passagens cômicas, o que não parece ser a especialidade da Bíblia.

Fonte: Omelete por André Conti



ELENCO:
Robert Langton Lloyd,
Erika Alexander,
Maurice Bénichou,
Amba Bihler,
Lou Bihler,
Urs Bihler,
Ryszard Cieslak,
Georges Corraface.
FICHA TÉCNICA
Diretor: Peter Brook
Produção: Michel Propper
Duração: 171 min.
Ano: 1989
País: Reino Unido/ França
Gênero: Drama

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