sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Trechos da tese de doutorado de Rogério Ferraraz






Essa dupla exposição de Lynch, ao modo de vida e ao cinema americanos e às experiências vanguardistas e do pós-guerra européias, acabou por moldar seu cinema: um cinema denominado por uns de híbrido, por outros de esquizofrênico e pós-moderno, mas que aqui foi chamado simplesmente de limítrofe, ou fronteiriço – o que não exclui elementos daquelas outras definições. Esse cinema limítrofe encontra-se nas fronteiras do ilusionismo e do antiilusionismo, da narrativa clássica e das propostas de vanguarda, do cinema comercial e do filme experimental. Ele tanto explora as convenções narrativas quanto realiza uma renovação da linguagem cinematográfica. Com seus filmes, Lynch procura penetrar nas entranhas da sociedade norte-americana através do desnudamento dos sentimentos, das angústias e dos medos. No mesmo ato em que desvenda cada personagem individualmente, ergue o véu da aparente felicidade que encobre aquela sociedade. Esse jogo entre individual e social é trabalhado de forma paralela e análoga à maneira com que a câmera habita e percorre ambientes fechados e abertos, internos e externos, o que se reflete, por sua vez, no embate claro-escuro. Mas, quebrando a visão dicotômica de separação entre interior e exterior, entre espírito e matéria, entre mortos e vivos, entre maldade e bondade, entre loucura e sanidade, suas obras embaralham o sentido das coisas para mostrar a complexidade do ser humano mergulhado no mundo, um mundo misturado e caótico.

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