Avaliação: NOTA 6
 


A crise financeira global de 2008, que ainda dá mostras de não ter acabado, está quase se tornando um subgênero em Hollywood. E o melhor é que a diversidade caracteriza a abordagem da temática nos cinemas. “Amor sem Escalas” deu início a esse hall de filmes ao utilizar o assunto como pano de fundo para uma história mais universal. O premiado documentário “Trabalho Interno” fez diferente e mergulhou na crise, explicando-a detalhada e didaticamente, devendo ser assistido juntamente com o interessantíssimo “Margin Call – O Dia Antes do Fim”, que ficcionaliza o declínio de uma gigantesca empresa em apenas algumas horas.

Como não falta bom humor no cinema industrial dos EUA, o assunto agora virou comédia com uma forte pitada de ação. Em “Roubo nas Alturas”, o diretor Brett Ratner junta Ben Stiller e Eddie Murphy e exibe o dia em que os verdadeiros prejudicados pelo rombo financeiro decidiram se vingar. O plano é idealizado por Josh Kovacs (Stiller), o gerente da Tower, um super-prédio residencial que está entre um dos milhares de bens do investidor Arthur Shaw (Alan Alda). A prisão de Shaw pelo FBI, no entanto, revela que aquele homem gentil não passava de um fraudador capaz de dar golpes até em seus próprios funcionários, esvaziando as suas pensões.

Demitido depois de se revoltar contra a atitude de seu chefe, Kovacs monta uma equipe que tem como objetivo roubar dinheiro de Shaw em um cofre na cobertura do prédio. O problema é que nenhum deles está acostumado com a prática e, por isso, torna-se necessária a participação de um ladrão profissional no bando. Slide (Murphy), então, surge e conclui o grupo formado pelo ex-balconista Charlie Gibbs (Casey Affleck), pelo ex-ascensorista Dev’reaux (Michael Peña) e pelo falido acionista Sr. Fitzhugh (Matthew Broderick), que ainda ganham a colaboração da camareira Odessa (Gabourey Sidibe).

A participação de Eddie Murphy força, inevitavelmente, associações com suas comédias de mau gosto de humor escrachado e muitas vezes escatológico. Mas “Roubo nas Alturas” pertence a Brett Ratner, o mesmo diretor responsável pela franquia “A Hora do Rush”. Estamos diante, então, de uma ação cômica que depende de uma história no mínimo plausível para funcionar. E, de fato, o filme possui esse comprometimento, revelado logo em seu início, que exibe a puxada rotina de trabalho na Tower, sob a liderança do dedicado Kovacs, que não permite nem o uso de celular durante o serviço e que já acorda pensando nas refeições que oferecerá ao seu chefe.

Em seus primeiros trinta e melhores minutos, o longa sustenta-se em diálogos leves e rápidos (beneficiados por uma edição dinâmica) que, eventualmente, trazem momentos de descontração, os quais acontecem naturalmente, advindos da natureza de seus personagens. Fugindo de caricaturas, o roteiro de Ted Griffrin e Jeff Nathanson tira graça da falta de cultura e instrução de alguns ou da teimosia de outros, como na cena em que Charlie parabeniza uma coreana pelo ano novo chinês ou na que a moça insiste em dizer que não estava estudando durante o serviço.

Mesmo assim, jamais torna-se destoante o aparecimento de Eddie Murphy com todas as suas caras, bocas e linguajar particular, já que a comicidade permanece apostando em naturais atos de bizarrices. Apenas não passam a ocorrer de forma tão isolada como anteriormente. A presença de Ben Stiller também ajuda a manter a sobriedade da produção, graças a um protagonista carismático e minimamente verossimilhante, que chega quase a se apaixonar pela agente do FBI Claire Denham (Téa Leoni), em um “romance” que é um dos grandes acertos do roteiro ao nunca soar idealizado ou clichê.

Ao desaguar na ação, porém, o filme declina. Além de ser extremamente previsível, a sequência do roubo conta com questionáveis atos de esperteza do roteiro e da edição. Ainda assim, as falhas e faltas de explicação para certos acontecimentos ficam explícitas. Mostrando o plano e as consequências dele, mas por diversas vezes escondendo como de fato ocorreu, a trama perde força, chegando ao ponto de sacrificar o único momento dramático de uma produção que tem como pano de fundo a dolorosa crise financeira.

Algumas interpretações também incomodam, especialmente a de Matthew Broderick, absolutamente perdido no papel do homem que tinha tudo e passou a ser devedor em questão de dias. O personagem, por sinal, poderia ser melhor explorado pelo roteiro, que acaba por usar a crise apenas como contexto, dispensando críticas e ironias, como “As Loucuras de Dick e Jane” havia feito mesmo três anos antes do acontecido. Com um desfecho súbito, que deixa brechas para todos os lados e não conclui suas inúmeras tramas, “Roubo nas Alturas” diverte sem comprometimento quando poderia ser bem melhor.
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Darlano Dídimo é crítico do CCR desde 2009. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é adorador da arte cinematográfica desde a infância, mas só mais tarde veio a entender a grandiosidade que é o cinema.