quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Admirável mundo novo (minha mais recente versão)



Li o famoso livro de Aldous Huxley (este, onde fui buscar o título para o post de hoje) quando estava na faculdade – época em que, posso afirmar com segurança, entramos em contato com livros que não esqueceremos jamais. Aliás, se eu for começar a lembrar – “O que é isso, companheiro?”, “Memórias de Adriano”, “Porcos com asas”, “O nome da rosa”, “O quarteto de Alexandria”, “Trópico de câncer”, “Morangos mofados”, “A tragédia da Rua das Flores”, “Maldição eterna a quem ler estas páginas”… – sei que vou divagar, e ainda está muito cedo para isso! Citei “Admirável mundo novo” como inspiração porque, além de evocar a visão utópico-pessimista do livro – que projeta um futuro desumano para nossa mal-fadada espécie, em meados do século 26! –, a frase é quase que um bordão pessoal para mim.

Muito tempo depois que li o livro, descobri que ela foi tirada de uma das mais belas obras de Shakespeare, “A tempestade” – e com um sentido bem diferente do que aquele que eu costumo pegar emprestado. Na voz de Miranda, uma das personagens principais da peça, ela celebra um lugar onde as pessoas são fantasticamente interessantes, cercadas de magias e encantos, num convite sedutor – e, em última análise, perverso – para que se fuja da realidade. Huxley, claro, distorce esse sentido no seu livro, ironizando o deslumbramento de Miranda para descrever um mundo talvez admirável “cientificamente”, mas execrável do ponto de vista humano e social.

Minhas intenções, humildemente, são bem mais simples do que essas… Costumo dizer que estamos diante de um “admirável mundo novo” quando me vejo cara a cara com uma nova descoberta – quase sempre tecnológica. Não precisa ser grande coisa não – me lembro, por exemplo, de ter pensado nisso quando vi o filme de animação “Aladim” pela primeira vez… (o mesmo aconteceu depois com “Toy story”, “Shrek” e “Rattatouille”…). Ou quando eu consegui mandar a primeira foto por telefone para alguém… Coisas assim.

E esta semana senti-me inspirado novamente a usar essa expressão quando descobri uma nova ferramenta na internet chamada Google Arte Project – simplesmente a coisa mais legal que poderiam ter feito para quem sempre sonhou conhecer os museus mais importantes do mundo, mas ainda está bem longe conseguir um orçamento razoável para tal façanha! É tão simples assim: com apenas alguns cliques – e, claro, uma conexão razoável de internet – você vai poder passear pelos corredores das maiores coleções de arte que o homem já conseguiu juntar.

O truque é simples: o Google usou a mesma tecnologia do Streets View, aparentemente (faço essa ressalva porque não entendo nada desse assunto, mas parece similar), mas dessa vez não para registrar casas e pessoas (e eventualmente cadáveres!) e compor um mapa “realista” da cidade, e sim as salas e obras de alguns museus que são referência universal para os amantes de arte. Eu, particularmente, nunca achei muita graça em perder meu tempo com o Street View – a não ser para conferir os instantâneos dos endereços que frequento (e, eventualmente, algum flagrante de uma figura conhecida). Um mapa, até que me provem o contrário, é sempre mais útil quando visto de cima – e, como viajante tarimbado, posso confirmar que é assim que me organizo espacialmente em qualquer lugar do mundo onde visito. Ver as ruas “de frente”, pelo menos até agora, não provou ser muito prático no sentido de ajudar a me localizar em uma cidade (sobretudo em uma cidade que não conheço). Mas quando eles resolveram aplicar o mesmo truque dentro de um museu…

Aí sim temos um “admirável mundo novo” – aquele em que qualquer pessoa que consiga chegar perto de um computador conectado à internet pode ter diante de seus olhos algumas das obras de arte mais deslumbrantes que o homem já produziu!

Algum tempo atrás, aqui mesmo neste espaço, eu comemorava a facilidade de poder acessar acervos inteiros de museus e lugares históricos através da internet. Com a intenção de se tornarem mais acessíveis pelo mundo, muitos museus estavam disponibilizando nos seus sites reproduções das obras de suas coleções. Se a qualidade dessas imagens ainda não eram ideais (muita coisa melhorou, desde comentei sobre isso, em 2007), só a notícia de que existia essa iniciativa já era para ser celebrada. Porém, o que o Google Art Project oferece vai muito além dessa proposta – não só os trabalhos de várias épocas e vários artistas estão disponíveis para apreciação (muitos deles em alta definição), mas você pode ter a sensação de estar virtualmente passeando pelos corredores dos museus, e escolhendo sobre que obras você quer saber mais, olhar mais de perto, ou simplesmente em frente de qual tela você quer deixar sua imaginação divagar (uma atividade que me é muito cara, claro). Aliás, quase exatamente como você faz num grande museu…

 

Por onde você quer começar? Que tal pela sala do Templo de Dendur – um “templo” mesmo, egípcio, do século 15 (antes de Cristo), que está montado quase intacto em todo seu esplendor numa das salas mais nobres do Metropolitan Museum de Nova York? Este é um dos meus lugares favoritos no mundo, uma espécie de centro de peregrinação para mim, que “me obrigo” a passar lá todas as vezes que vou à cidade, como um ritual. Vá em frente e explore mais no Metropolitan – ainda que esse não seja o mais completo passeio que você pode dar no Arts Project (são poucas as salas que estão disponíveis na íntegra, por enquanto).

Para uma experiência mais completa, posso sugerir o Museu Van Gogh, em Amsterdã? Não é um grande museu, se você pensar apenas em área construída ou mesmo em quantidade de obras no acervo. Mas ele abriga simplesmente a mais concentrada coleção de um dos artistas mais importantes – e certamente o mais cobiçado – de todos os tempos. É praticamente impossível alguém não se deixar seduzir por Van Gogh – pelas suas obras, pelas suas cores e pinceladas, pela sua loucura. Agora, mesmo que a capital holandesa esteja bem longe de seus planos, você pode conhecer cada peça desse acervo, e se perder no universo fascinante desse artista…

Ainda nas “pequenas” coleções, sugiro que você passe então para a Frick Collection, em Nova York. Nascido de uma coleção particular – digamos, uma “poderosa” coleção particular –, o museu é visita obrigatória para quem passa pela primeira vez pela cidade. Concentrado no melhor dos clássicos artistas europeus – só Vermeer (um dos artistas mais raros e admirados do mundo), a Frick tem três! – o acervo é um delírio para quem gosta de explorar arte de uma maneira mais íntima. E essa mesma “intimidade”, ainda que virtual, você pode desfrutar agora no Google Arts Project.

Pronto (ou pronta) para vôos mais altos? Então que tal passear pelo Palácio de Versailles? Esse mesmo, o “templo do luxo”, “casa dos excessos”, retiro de Luís 14… Pois ele está lá, em todo seu esplendor – e com uma definição bastante razoável, especialmente para quem nunca teve a chance (ainda!) de conhecer aquilo tudo de perto. Ah sim, os jardins também estão disponíveis para visita – e embora a sensação, ao ar livre, seja um pouco mais “congelada”, a beleza é tamanha que você pode, num simples exercício de imaginação, sentir-se circulando por lá!

Até agora, falei de museus e lugares que já tive o prazer de conhecer pessoalmente. Estou aqui exaltando a qualidade de um projeto desses, tentando não pensar nas diferenças entre ver uma coleção “ao vivo” e “virtualmente” – até porque, reconheço que ter podido visitar vários desses lugares (alguns até mais de uma vez) é sim um privilégio. Mas será que a “magia” do Art Project funciona também para lugares que eu ainda não conheci? Será que eu posso mesmo recomendar com entusiasmo uma idéia como essa – que vai aproximar milhões de pessoas a coleções únicas de arte que talvez elas jamais vão conhecer pessoalmente?

Para tirar essa dúvida, fui conferir o Museu Hermitage, que fica em São Petersburgo, na Rússia – país que nunca visitei (e você acha que eu conheço o mundo inteiro…). Apesar de já ter visto reproduções de várias peças desse acervo – e, eventualmente, até uma ou outra obra ao vivo, emprestada temporariamente para algum outro museu que eu estivesse visitando – sempre tive a maior curiosidade para ver essa que é, notoriamente, uma das coleções mais belas do mundo. A boa notícia é que, pelo menos até eu ter a oportunidade de passar por São Petersburgo, minha curiosidade está saciada – só de passear virtualmente pelos corredores do Hermitage no Google Art Project.

Mas tem muito mais… Explore o belíssimo “Nascimeto de Vênus”, de Botticelli, na galeria Ufizzi, em Florença, na Itália. Chegue perto de “Os embaixadores”, de Hans Holbein, na National gallery, em Londres. Navegue entre os Cézanne do MoMA, de Nova York. Confira cada detalhe de “Ronda noturna”, de Rembrandt, no Rijksmuseum, em Amsterdã. E, usando uma ferramenta que o próprio site oferece, construa você mesmo sua coleção de arte “virtual”. Outros museus, outras galerias – e certamente outras obras-primas devem se juntar ao projeto.

Por isso mesmo, pode comemorar: pelo menos para quem ama museus, este é sim um admirável mundo novo…

O refrão nosso de cada dia

“La culpable”, Aterciopelados – esta banda (hoje num hiato) já foi a grande promessa do rock alternativo colombiano. Existe “rock alternativo” colombiano”? – você já está se perguntando…  “E como!”, é a minha resposta. “Shakiras” à parte – uma artista cujo talento e apelo pop mundial é inquestionável – a Colômbia faz um dos melhores pop da América latina há décadas, e o Aterciopelados é uma das provas mais recentes disso. Da sua vasta coleção de ótimas canções poderia tirar uma boa dúzia de refrões, mas o de “La culpable” é meu favorito – talvez pela “harpa paraguaia” ao fundo, sublimemente entrelaçada com os vocais sôfregos do coro. Sugiro que você os explore mais…

(para entender e aproveitar melhor este espaço, clique aqui)

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