segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Justin Bieber – Never Say Never

A estreia de Justin Bieber nos cinemas combina um documentário covarde e superficial e um espetáculo musical extremamente bem produzido.


Thiago Siqueira
Avaliação: 4/10
 
 

Provavelmente, se você quer ver “Justin Bieber – Never Say Never”, você é um fã do jovem que irá se divertir, não se importando com os acertos ou equívocos do filme, apreciando uma oportunidade de conferir uma apresentação na tela grande do seu cantor favorito. No entanto, como obra cinematográfica, a fita deve ser analisada como tal. Não pretendo julgar o trabalho como músico de Bieber, mas não me furtarei de ver o documentário do qual ele é foco como um filme, não como mais um pedaço de um fenômeno.

A trajetória do jovem canadense é algo que parece ter saído de uma película. Filho de uma mãe adolescente que o criou com a ajuda dos seus pais, ele descobre desde criança ter carisma e talento para música. Descoberto por um empresário que viu seus vídeos no YouTube, Justin começa uma jornada que o tornaria um astro.

Ou seja, além de uma história de superação, ainda temos a criação de um ídolo da Geração Y, que alcançou multidões contando com as redes sociais, uma história extremamente atual e que sustentaria um filme por si, além dos conflitos de um garoto que abandona uma vida comum para se tornar um astro adorado por milhões, mas que ainda tem de lidar com a pressão e as responsabilidades que a fama acarreta.

Esses interessantes temas são citados pela trama, mas logo se perdem no meio aos vários ângulos que o longa deseja abordar, sendo trazidos à baile algumas vezes e depois abandonados novamente. Além da trajetória de Justin, ainda temos os bastidores de sua turnê, depoimentos de seus amigos, parentes, professores e influências (até Snoop Dogg aparece aí) e, é claro, várias músicas de seu show no Madison Square Garden, sendo que este concerto em especial é mostrado como o ápice do sonho do garoto.

Interessante notar que temos muitas pessoas próximas (e algumas nem tanto) a Justin Bieber falando sobre ele, mas ele mesmo quase nunca conversa com o espectador, quase como se o filme quisesse manter a distância entre ídolo e público, mostrando cenas bobinhas protagonizadas por ele nos bastidores, mas não mostrando muito de quem ele é realmente ou quais suas motivações. Em algumas sequências, uma imagem mais intimista ou reveladora chega à tela, como o momento em que Bieber conversa com uma pequena violinista nas escadas onde ele cantava, mas cenas como essa são raras. A mensagem que temos é “fique com a imagem, esqueça o conteúdo”.

Em seu terceiro ato, o longa investe em um arco dramático falando de um problema de garganta enfrentado por Justin às vésperas de seu show no Garden, um último obstáculo para que ele conquistasse o seu sonho. O problema é que este arco é sabotado pela própria estrutura do filme, que exibe, durante toda a projeção, músicas desse mesmo show, matando qualquer suspense ou tensão que esse plot poderia ter.
Nisso, temos um filme raso, covarde até, que tem medo de expor o seu objeto (o próprio Justin) para o público e falha em trabalhar melhor uma história de triunfo que poderia atingir audiências que podem não simpatizar com o som de Bieber, mas que aplaudiriam o fato de que o garoto chegou aonde chegou por conta de sua perseverança e por sua sorte de ter surgido no momento tecnológico certo.
No entanto, saímos da sala apenas com a imagem produzida daquele que, em tese, era a figura central de um documentário, com o longa falhando em retratá-lo com uma pessoa real. Bieber não é tão conhecido quanto um membro dos Rolling Stones, cujas opiniões e desventuras são públicas e notórias, e essa era a sua chance de se apresentar a um público que não o conhece e ganhar o seu respeito.

Os fãs irão se deliciar com os números musicais do filme. E eles são realmente muito bem produzidos, com a fotografia 3D funcionando muito bem junto ao público, fazendo com que a audiência se sinta realmente imersa no show, com toda a sua pirotecnia e extravagância. Talvez o longa devesse ter se concentrado nisso e mostrado apenas algumas cenas de bastidores.

A película tropeça nas próprias pernas por conta de sua megalomania e perde a oportunidade de dar ao seu protagonista a chance de se mostrar não como um ídolo inatingível e fabricado, mas como um jovem talentoso e realmente tridimensional. O 3D, no entanto, acaba quando tiramos os óculos, com Bieber continuando tão bidimensional e artificial quanto seus cartazes.

Observação: A dublagem da fita deve ser uma das piores que já pude acompanhar no cinema. Sabendo que a produção é voltada para um público mais jovem, existem pouquíssimas cópias legendadas. Nas dubladas, provavelmente buscando um meio-termo entre preservar o som original e realizar uma dublagem, o que temos no filme é uma versão brasileira que lembra a dos documentários do Discovery Channel, sem muita emoção ou cuidado, com as vozes nacionais sobrepostas às originais, mas com estas ainda podendo ser ouvidas. Terrível.
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Thiago Siqueira
é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.

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